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Dor de cabeça. Quem não tem?

29 de Maio de 2019 às 00:01

Mário Cândido de Oliveira Gomes

É difícil encontrar alguém que nunca apresentou um episódio de cefaleia ou dor de cabeça, sendo, inclusive, uma das queixas mais frequentes no atendimento médico. Realmente, 90% da população teve cefaleia em alguma fase da vida, sendo 75% entre as mulheres e 55% nos homens. Até 16% dos pacientes procuram serviços de urgência pela intensidade da dor, e em mais de 90% destes, a cefaleia não é causada por doença grave. A dor de cabeça acomete 3% das crianças na idade pré-escolar, elevando-se para 39% aos 6 anos e 70% aos 15 anos. Todavia, é mais frequente entre os 45 a 50 anos, caindo para 3% a 5% nas pessoas com mais de 65 anos de idade. A Sociedade Internacional para o Estudo da Dor classifica 66 síndromes dolorosas que acometem o segmento cefálico ou a região cervical, sendo as cefaleias classificadas como primárias ou secundárias e subdivididas em 13 grupos.

As primárias mais incidentes são: enxaqueca, cefaleia do tipo tensão e cefaleia em salva, que se caracterizam pela ausência de anormalidades aos exames de imagem (radiografia, tomografia, ressonância, etc) e de laboratório (Iíquor, etc). A enxaqueca ocorre em 3% a 35% da população, predomina no sexo feminino (20% a 34%) e nos indivíduos com 25 a 55 anos de idade. Em 9% dos casos as crises são frequentes, sendo que 80% têm mais de um ataque por mês. A primeira crise geralmente acontece antes dos 40 anos de idade e declina com o correr dos anos. A prevalência da migrânea aumentou nos últimos anos em virtude do melhor conhecimento da enfermidade e dos fatores de risco, como estresse, alimentação, fumo e bebidas alcoólicas. A susceptibilidade para a enxaqueca é genética em 50% dos casos, com risco quatro vezes maior nos parentes de primeiro grau.

Atualmente acredita-se que os transtornos enxaquecosos decorrem da inflamação dos nervos, dilatação dos vasos, etc. provocados por neurotransmissores (serotonina, histamina, catecolaminas, etc). A cefaleia de tensão é observada em 35% a 78% da população, predomina nas mulheres (34% a 86%) e, principalmente, na quarta década da vida. É responsável por 40% dos atendimentos médicos especializados e se manifesta sob duas formas: episódica (70% a 90%) e crônica (2% a 3%).

A crônica é um subtipo da assim denominada cefaleia crônica diária, aquela que aparece todos os dias, em qualquer hora e circunstâncias diversas, sendo responsável pelo uso e abuso dos analgésicos. Aliás, tem gente que precisa tomar produtos para dor de cabeça todos os dias, nos 365 dias do ano. Mais da metade dos chamados “enxaquecosos” apresenta cefaleia tipo tensão e 25% dos portadores de cefaleia de tensão apresentam enxaqueca. Como se pode observar, a confusão é grande no reino das algias. Por outro lado, a cefaleia em salva é menos prevalente, ocorrendo em 0,004% a 0,009% dos indivíduos. Neste caso, a dor de cabeça é mais incidente em homens e na raça negra.

Na quinta e sexta décadas da vida surgem as nevralgias da face, como a neuralgia idiopática (causa desconhecida) do trigêmeo. Sua incidência varia de 0,1% a 0,2%, predomina do lado direito do rosto e manifesta-se em 4% dos portadores de esclerose múltipla. A neuralgia do nervo glossofaríngeo incide em 0,07% da população, enquanto do herpes zoster em 1,3 a 4,8 por 1.000 habitantes/ano. A nevralgia do herpes ocorre em qualquer setor do organismo, sendo mais frequente nas mulheres e idosos, principalmente nos portadores de baixa resistência (diabetes, câncer, aids, etc).

Uma dor extremamente frequente na face é a dor de dente, que aparece em 4% a 50% da população. A dor de cabeça traz numerosos prejuízos pessoais e econômicos, além de comprometer o desempenho físico e psicológico. É preciso maior conscientização da população para fazer o diagnóstico correto do problema e procurar o tratamento da causa. As pessoas portadoras de dor de cabeça não devem se automedicar ou, como se diz na gíria, “empurrar o problema com a barriga”, transferindo para o São Nunca a resolução de tanto infortúnio e sofrimento. A hora é agora ou até já passou da hora. Seja esperto. Não durma no ponto, como chofer de táxi.

Artigo extraído do livro Doenças - Conhecer para prevenir (Ottoni Editora), de autoria do médico Mário Cândido de Oliveira Gomes, falecido aos 77 anos, no dia 6 de junho de 2013.