O direito à divergência é uma característica essencial da sociedade democrática. Calar os dissidentes; perseguir os que pensam de maneira diversa; encarcerar os adversários; aplicar rótulos difamantes àqueles que pensam de outra maneira; açular a polícia, os torturadores e os carrascos contra quem não endossa um determinado ponto de vista é uma tenebrosa e odienta marca das ditaduras -- como vemos, a todo dia e a toda hora, em diferentes pontos do mundo.

Isso vale para todas as pessoas. O direito à livre expressão do pensamento exatamente por isso se inscreve em todas as declarações de direitos humanos e é tutelada por todos os regramentos jurídicos que dela derivam. Os que passam a mão na cabeça de governantes e autoridades destrambelhadas que não respeitam tais prerrogativas estão, sim, em alguma medida, legitimando condutas cuja legitimação é impossível.

Todos têm o direito a buscar a verdade, mas essa busca deve sempre efetuar-se na caridade. Por mais acalorado que seja o embate de pontos de vista, jamais é lícito, àquele que se diz seguidor de Jesus, buscar a destruição do seu semelhante, ainda quando a conciliação de entendimento, a convergência de concepções, a partilha dos ideais se mostrem impossíveis.

O Evangelho nos convoca a viver na luz.

Temos o direito de questionar, criticar, detestar e tentar demolir, com todos os argumentos racionalmente defensáveis que sejamos capazes de articular, doutrinas, práticas e crenças pelas quais temos aversão.

O que não nos é dado, em terreno ou momento algum, é fazer disso um pretexto para oprimir ou suprimir aquele que as exprime. Por intenso que seja o vendaval da discussão, ele não pode apagar, dentro de nós, a chama da caridade e do amor fraterno.

"O que ama o seu irmão permanece na luz, e nele não há ocasião de queda. Mas o que odeia o seu irmão está nas trevas; caminha nas trevas e não sabe aonde vai, porque as trevas cegaram os seus olhos."

1ª Carta de João 2:10-11 - Bíblia de Jerusalém

Geraldo Bonadio é jornalista - [email protected]