Dedo no gatilho
Crédito da foto: US Navy / Michael Clemente / AFP
Carlos Brickmann
Nosso futuro está sendo decidido bem longe daqui, às margens do Golfo Pérsico, onde o Irã apresou um petroleiro britânico e se recusa a devolvê-lo. O Irã, como há alguns anos o Iraque, parece convencido de que pode vencer uma guerra contra uma grande potência. E a Inglaterra, ainda mais que os Estados Unidos, não costuma aceitar provocações. Já armou uma frota para reconquistar as Ilhas Falklands, ou Malvinas, sem grande valor ou posição estratégica, apenas para retribuir a tomada da área pela ditadura militar da Argentina. Foi uma operação exemplar: desembarque, cerco do inimigo, e em seguida a questão foi entregue aos gurkhas, soldados do Nepal que há séculos formam uma temida unidade de elite do Exército britânico.
São eméritos lutadores no corpo a corpo, com punhais. Defendem a tese de que, uma vez desembainhado,o punhal só pode voltar à bainha depois de ser molhado com o sangue do inimigo. O Reino Unido tem uma excelente frota aérea, produz bombas nucleares, faz parte da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), e conhece o Irã desde o tempo em que foi o aliado favorito do xá Reza Pahlevi. Aliás, o pai do xá, Reza Xá, andou se aproximando dos nazistas e foi deposto pelos ingleses, que passaram o trono a seu filho. Os ingleses conhecem a fundo a economia do país: a Anglo Persian (depois Anglo Iranian) Oil Company foi por eles estruturada.
Os ingleses criaram os comandos, que tanto atrapalharam os nazistas na Segunda Guerra Mundial; e têm o internacionalmente famoso SAS, Strategic Air Service, grupo de elite para intervenções rápidas. O Irã, como antes dele o Iraque, parece convencido de que está bem protegido contra grandes potências. Não está: lembremos que o porta-voz do Governo iraquiano foi à TV proclamar a vitória contra os invasores americanos e, por trás dele, já se viam tanques americanos tomando Bagdá. O Irã pode estar bem preparado, mas mexer com grandes potências não é coisa que costume dar certo.
E para nós?
Queira ou não, o Brasil está envolvido nessa questão. Primeiro, pelo preço do petróleo: não apenas uma guerra, mas o bloqueio do Estreito de Ormuz, por onde passa boa parte do petróleo do mundo, fará o preço subir. E não esqueçamos de que o presidente Bolsonaro já disse que estamos alinhados aos Estados Unidos -- que, por sua vez, estão alinhados com a Grã-Bretanha, seu mais tradicional aliado. Talvez o Brasil até lucre com a alta dos produtos que exporta, mas a tendência é que a guerra prejudique todos os envolvidos.
Novo comando
Boris Johnson ganhou a disputa interna e é, a partir de hoje, o novo primeiro-ministro britânico. Johnson quer, em primeiro lugar, completar a saída da Grã-Bretanha da Comunidade Europeia, com acordo ou sem acordo. E certamente, por seu temperamento, será mais agressivo que Thereza May, a primeira-ministra que ele substitui. Johnson está mais próximo de Margaret Thatcher do que de Thereza May. E foi Margaret Thatcher que determinou a invasão das Ilhas Falklands (que teve como consequência quase imediata, a queda da ditadura militar argentina).
Ficaram de mal
Marcos Cintra, secretário da Receita Federal, não aceita a proposta de reforma tributária em discussão no Congresso (elaborada por um economista conceituado, o ex-secretário do Tesouro Bernard Appy, que propõe a união de cinco tributos num só). Cintra diz que será “o maior imposto do mundo”, embora ele venha defendendo há anos o imposto único, que reuniria num só todos os impostos arrecadatórios hoje cobrados no país. Rodrigo Maia, o presidente da Câmara, defende a reforma que o Congresso discute, e ataca: diz que Cintra tem “inveja e recalque” da proposta de reforma tributária, e o chama de “bajulador”. Tudo bem, esse pessoal costuma fazer as pazes logo e esquecer a troca de insultos, mas o clima entre Congresso e Receita é ruim.
Os vários pesos
O prefeito tucano de São Paulo, Bruno Covas, diz que se o ex-governador mineiro Aécio Neves não sair do PSDB, por livre e espontânea vontade ou expulso, quem sai do partido é ele. O governador tucano João Doria já faz tempo que defende a saída de Aécio, queimadíssimo após a gravação de uma conversa em que pede dinheiro a Joesley Batista. Mas Aécio não é o único: o ex-governador goiano Marconi Perillo está envolvido em vários inquéritos e já esteve preso. Perillo, amplamente derrotado nas eleições (embora houvesse duas vagas para o Senado, não conseguiu nenhuma; e seu candidato a governador, José Elinton, tomou uma surra de Ronaldo Caiado). Por que a pressão sobre Aécio e a tolerância com Perillo?
Carlos Brickmann é jornalista -- [email protected]