De fé e milagres
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Edgard Steffen
Audrey Marsh, 34 anos, soterrada por neve durante excursão nas montanhas, foi ressuscitada por médicos espanhóis, após 6 horas de parada cardíaca. (Dos jornais)
Recomendo “Superação - O milagre da fé”, filme baseado em fato similar acontecido no Missouri (USA, 2014). John, 14 anos, brincava com dois amigos no congelado lago Sainte Louise. O gelo cedeu e os três caíram na água, avaliada a 40ºC negativos. O socorro imediato içou dois meninos, logo aquecidos e recuperados. John continuou imerso. O bombeiro que atuava no resgate, prestes a desistir da busca ao afogado, ouviu uma voz mandando-o dirigir o gancho para outro lado. Içou o garoto -- permanecera submerso por mais de 15 minutos -- sem movimentos respiratórios e sem batimentos cardíacos. Levado ao hospital, foi considerado morto pelo clínico e pelo neurocirurgião. A mãe não aceitou e permaneceu ao lado do leito orando sem cessar. Sua tenacidade implacável inspirou a comunidade a também orar pelo impossível. E o milagre aconteceu. Enregelado e falecido por cerca de 60 minutos o menino contrariou todos os prognósticos. Voltou à vida. Sem qualquer sequela, continuou seus estudos e voltou a jogar basquete com habilidade de craque.
Médicos adquirem certo ceticismo diante das vivências no aprendizado e no exercício da profissão. Aprendemos, por exemplo, que as células cerebrais começam a morrer após 4 a 6 minutos sem receber sangue¹. Em 10 minutos, morte certa. Pacientes de anóxia (falta de oxigenação) cerebral grave, quando sobrevivem, apresentam sequelas neuromotoras limitantes. No caso de John, muitos atribuem a sobrevida à supercongelação. Mas, como explicar a ausência de sequelas? Ou a orientação ouvida pelo bombeiro? Ninguém falara com o socorrista.
De quem veio a orientação? O episódio lembra a pesca milagrosa descrita no capítulo 21 do Evangelho de João: “Lancem a rede do outro lado do barco!”
Ao responder sobre milagres, Augusto G, estudante de Medicina, narra o caso de sua irmã. Ao nascer, recebeu nota 2 no teste Apgar². Neuropediatra prognosticou que ela se tornaria portadora de paralisia cerebral infantil, porque ficara 6 minutos em anóxia. Acompanhados pela avó, ele e seu irmão rezaram, ajoelhados.
No relato, citou-me como lendário (sic) médico de Sorocaba. (Ops! Mexeu com minha vaidade, vou ter que correr atrás do vento. Só porque contrariei o prognóstico do neurologista e tranquilizei a mãe). Concluiu o depoimento. “Eu não apenas acredito em milagres; sei que eles existem. A Bruna é um deles” (...) “Os milagres, ao contrário do que se profunde, não são a prova do impossível, mas a prova do possível.” (...) “A oração funcionou (...) Deus atendeu nosso pedido de proteger Bruna.”
Dr. João Henrique Steffen³, falecido ginecologista obstetra evangélico, narrou dois casos estranhos por ele vivenciados em Londrina (PR). Senhora atendeu, pela janela da cozinha, ambulante vendedor de artesanato. Nada comprou. Ele foi embora, mas logo voltou e lhe deu um conselho “Se eu fosse a senhora, iria ao médico para examinar seu útero”. Foi embora. Ela procurou Dr. João. Diagnosticado a tempo, livrou-se da morte por câncer uterino.
Noutro caso, ele pediu que a auxiliar de enfermagem levasse paciente à sala própria ao exame ginecológico. Ajudasse a consulente e permanecesse junto a ela, o tempo todo, como exige a prudência e o protocolo. Paciente devidamente preparada, Dr. João entrou na sala. Terminado o procedimento, solicitou exames subsidiários. No retorno, a paciente (sem nenhum distúrbio psíquico, informe-se) fez surpreendente pergunta.
-- Doutor, por que o senhor mandou aquele outro médico me examinar antes do senhor? Estava sentado ali; atrás da escrivaninha havia um retrato dele. Dr. João não tinha médico-assistente nem escrivaninha nem retrato na sala de exames.
Shakespeare pôs na fala de Hamlet: Há mais coisas entre o céu e a terra, Horácio, do que possa sonhar vossa vã filosofia. (There are more things in Heaven and Earth, Horatio, than are dreamt of in your philosophy).
1 AHA (American Health Association)
2 Teste de vitalidade para recém-nascidos (vai de 0 a 10)
3 Steffen Jr., J H Hospital Evangélico de Londrina Como eu vi e vivi
Sorocaba, dezembro 2019
Edgard Steffen é médico pediatra e escritor. E-mail: [email protected]