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Bota na varanda!

21 de Setembro de 2019 às 00:01

Bota na varanda! Crédito da foto: Neusa Gatto

Neusa Gatto

Xiiii... acho que hoje não estamos pra conversa. Penso e olho de soslaio pro Chiconauta que me fixa como se estivesse petrificado. Viro de lado. Torno a olhar. Sério, não tou querendo briga. Mas, se ele vier pra cima, vai ter. O cara não se enxerga. Pequeno. Cheio de cicatrizes de tanto apanhar por aí. E, ainda tem falta de um dente da frente. Um dos grandes. Quando ele boceja é hilário.

Pois bem. Fiquemos assim. Se vier, toma.

Ele parece entender. Desvia o olharzão dele de cima de mim. Se lambe. Aquele jeito que nós, felinos, temos pra disfarçar. Tipo “não tou nem aí”.

Devagar entra pela cozinha o Mestre. Senta. Olha pros lados. Pra mim. Pro Chiconauta. E, enfim, se deita sobre o tapete ao lado da pia. Aquele é seu lugar. Esteja quem estiver ali, fazendo o que for. Se espicha e até dorme...

Escuto um barulho na sala... Corro pra lá. Alguém conversa com a moça que mora aqui. Caiu um copo e ele começa a catar os cacos. Foi o barulho que ouvi.

Grafite. Onde você estava? Ouço dela. Me espreguiço e vou em sua direção. Roço minha cabeça em suas pernas. Ela adora. Eu amo! Então, vejo o sujeito a olhar pra mim. Sem pensar duas vezes dou-lhe uma patada. Credo, esse gato cada vez mais esquisito! Resmunga ele.

Esquisito? Você não viu nada. Trata de sair de perto dela porque não gosto disso. Não curto essas intimidades... Se sou ciumento? Sim. Possessivo eu diria eh, eh, eh...

Fite, ouço dizer, vem cá. Então, já estou no colo dela e ganho afagos na cabeça. Continuo alerta. Não perco de vista o sujeito.

Bota ele na varanda. Pelo amor de Deus. Esse gato é um capeta, diz o dito cujo. Como colocar na varanda? Penso e olho pra ela indignado.

Calma, ela diz pro medroso. Ele é um gato bom. Precisa acostumar com as pessoas... Se acostumar? Tá cansado de me ver e vive a boxear minha perna. Ah, tira ele... você ta vendo que ele me odeia.

Acertou, penso eu. Chato. Sem graça. Fala demais. Se acha. E... o que é pior... não sai mais daqui.

Então, vou pro chão e, em minutos, lá estou eu. Onde? Na varanda. Ela se rende. E eu, com meu melhor olhar humilde, fixo os dois pelo vidro da porta. Ela me olha. Vejo pena em seu olhar.

Ele segue o olhar dela e, sem falar nada, vem e abre a porta do terraço. Saio sem olhar pros lados. Muito menos pra ele. Pulo no sofá. Me ajeito no colo dela... Talvez eu comece a gostar um pouco desse cara.

Neusa Gatto é jornalista e produtora de vídeo