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As telenovelas são fórmulas gastas? (parte 1)

10 de Abril de 2020 às 00:01

Anteriormente, iniciei uma discussão sobre o esgotamento da linguagem cinematográfica, com ênfase às produções hollywoodianas, com enredos previsíveis. Neste artigo, amplio essa reflexão com um olhar crítico sobre as chamadas telenovelas, formato que, há décadas, ganha espaço na programação nas emissoras brasileiras, principalmente no chamado “horário nobre”, em que as famílias estão reunidas diante da telinha.

Primeiramente, duas perguntas são inevitáveis: será que essa popular fórmula de entretenimento, tão peculiar no horário nobre de várias emissoras, chegou ao seu esgotamento? Ou, o grande público, em decorrência de tantas opções que os canais por assinatura oferecem, tornou-se mais exigente? Delego ao leitor as respostas; porém, tais questionamentos se sustentam numa tese: tal formato amarga, continuamente, quedas brutais na audiência. Tanto que alguns projetos são abortados, quando não caem no gosto popular. Afinal, a audiência é o principal termômetro para teledramaturgia. E a televisão é impiedosa quanto a isso. Ou seja, se não desperta interesse, perde patrocinadores, não gera lucro; logo, o produto sai de cena.

Nesse âmbito, dentro das novelas globais, pelo que pude pesquisar, há pelo menos umas quinze produções que tiveram seus capítulos encurtados, porque não se identificavam com o gosto do telespectador ou havia rejeição dos amantes desse gênero, além de intrigas internas. A novela “Cuca legal”, de 1975, dirigida por Oswaldo Loureiro, embora tivesse o ator Francisco Cuoco no elenco, tornou-se sinônimo de fiasco. Tanto que o diretor declarou na época: “Cuca legal nasceu, cresceu e se perdeu”. Outra amarga decepção foi “Os gigantes”, de 1979, com Dina Sfat como protagonista da trama. Rotulada de “depressiva”, a produção também teve sua vida abreviada, situação que custou a demissão do autor Lauro Cesar Muniz.

Segundo o crítico de novelas, Nilson Xavier, nem mesmo Fábio Jr. segurou a audiência de “O amor é nosso!”, de 1981, pois não agradou a massa. Na fraca trama, o cantor representava um jovem em busca de sucesso. Resultado: saiu do ar antes do previsto. Dizem que, a partir disso, o cantor abandonou a carreira de ator. Além de alguns fracassos, a Globo teve que lidar com um caso de plágio com a novela “De quina pra lua”, de 1985. O dramaturgo Azis Bajur acusou o novelista Alcides Nogueira de copiar o enredo da peça “Velório à brasileira”. A novela também não sobreviveu por muito tempo.

Em seu blog, Xavier destaca os projetos globais com baixa audiência: “De corpo e alma” (1992-1993); “O mapa da mina” (1993); “Vira-lata” (1996). Uma curiosidade: nem a presença de Fernanda Motenegro, como protagonista, segurou a insossa “Zaza”, de 1997, último trabalho de Lauro Cesar Muniz, antes de migrar para a TV Record. Na concorrente, foi comandar o projeto “Máscaras”, em 2012, que não obteve bom desempenho. Nesse rol, estão ainda: “As filhas da mãe” (2001-2002); “Bang bang” (2005-2006); “Tempos modernos” (2010); “Além do horizonte” (2013-2014); “Geração Brasil” (2014).

Antes de se aposentar, Manoel Carlos escreveu “Em família”, de 2014, que não euperou seus trabalhos anteriores, “Por amor” e “Laços de Família”. Em 2015, a polêmica “Babilônia” teve o menor Ibope, em quase toda a história das telenovelas. Possíveis motivos: erotização exacerbada, cenas apelativas e violência gratuita. A esse grupo se juntam, ainda, a incipiente “O segundo sol” e a confusa “O sétimo guardião”. Detalhe: “Amor de mãe” não teve tempo de ser avaliada porque foi interrompida devido à Covid-19. Para aprofundar essa análise, no próximo artigo, abordarei a teledramaturgia das outras emissoras.

João Alvarenga é professor de Língua Portuguesa, mestre em Comunicação e Cultura, produz e apresenta, com Alessandra Santos, o programa Nossa língua sem segredos, que vai ao ar pela Cruzeiro FM (92,3 MHz), às segundas-feiras, das 22h às 24h.