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As sete porteiras

23 de Março de 2021 às 00:01

As sete porteiras Crédito da foto: Porteira Edson de Souza / Álbum de Família / Arte VT

O dia 25 de abril de 1932, época da Revolução Constitucionalista de 1932 marcada pelas tensões dos movimentos no Estado de São Paulo, Mato Grosso do Sul e Rio Grande do Sul, não impediu que uma família vibrasse de alegria com a chegada de mais um filho. Accacio Castanho de Almeida e Joana Pires Castanho unidos no amor conjugal pela fé cristã davam glória a Deus pelo parto saudável e saúde do menino João Batista. Ele nascia na pequena cidade de Guareí na região do Vale do Ribeira. Dia 25 de abril é dedicado a São Marcos, um dos apóstolos de Jesus. Durante dez anos, até 1942, o garoto João cresceu e se alfabetizou na escola guareiense com o professor Ezequiel Castanho de Almeida, seu tio paterno. Nascia aí a semente de um engenheiro aeronáutico formado pelo ITA -- Instituto Tecnológico da Aeronáutica e um escritor que no final de dezembro de 2020 me enviou por e-mail uma rara coleção de três livros que escreveu sobre as suas experiências de vida.

Para dar vida aos testemunhos do João Batista Castanho Sobrinho, autor das obras literárias, eu vou descrever neste artigo alguns dos detalhes que me fez viajar no tempo com ele e suas escritas. Convido o leitor a fazer o mesmo. Conta João Batista Castanho no primeiro volume que em Guarei todas as movimentações de pessoas eram realizadas em trilhas e pequenos caminhos rurais. Nos anos de 1920 seus pais relatavam que o transporte pelas estradas municipais para Itapetininga, Tatuí, Torre de Pedra, Bofete e Botucatu somente acontecia em carros de boi e carroças. Foi só em 1927 que surgiram pequenos caminhões e uma jardineira para duas viagens por dia. Saia de manhã de Guareí e retornava no final da tarde.

Os históricos moradores de Guarei lembrados por serem os primeiros a comprarem automóveis foram Nicolau Martins de Siqueira e Nicolau do Jonas e o professor João Alcindo Vieira. Um Ford 1937 comprado novo da fabricante fez tanto sucesso que acabou permanecendo com o dono até virar sucata. Muito curioso o fato de que toda a periferia da cidade era fechada por cercas de arame farpado para impedir a entrada de animais. Em cada saída para as estradas tinha uma porteira feita de tábuas e barrotes que girava em troncos. Eram sete porteiras. Isso sem contar os “mata-burros”, relata o autor.

Em suas recordações de infância João Batista Castanho disse que a população era muito pobre e dependia de realizar pequenas vendas de produtos caseiros nas ruas. Ele mesmo comercializava para sua tia Maria os bolinhos de farinha de milho recheados com carne de frango ou com fatias de linguiça de porco. Sua renda no final do dia era calculada pela tia em cinco por cento dos rendimentos obtidos.

Pensando nos dias atuais onde há centenas de salões de beleza nas cidades, como Sorocaba, eu fico a imaginar as citações do autor do livro nas peripécias das mulheres de Guareí. Não havia cabeleireira ou salão de beleza até 1940. Até então, as mocinhas faziam as suas unhas, passavam pó de arroz, rouge, batom e o talco embaixo dos braços para o suor sair perfumado. Para ondular os cabelos, enrolavam as mechas com pauzinhos de bambu ou taquara, como chamavam os mais antigos. Foi nessa época que surgiram também os famosos “permanentes” que deixavam por muito tempo os cabelos com cachos.

A vida em Sorocaba da família Castanho aconteceu no final do ano de 1947. Foi nessa época que os meus pais Ernesto e Carmela ficaram vizinhos. Accacio, Joana e os filhos foram viver em uma casa na rua Manoel Lopes 103, no bairro Além Ponte. Quando eu era menino em fase escolar cruzava com os Castanho na rua Santa Maria. Lembro-me da casa deles com jardim na frente e escadaria. Minha mãe era costureira e fazia as camisas do seminarista José Carlos, um dos filhos do casal. E quando as roupas ficavam prontas, com todo o cuidado meu irmão Darci levava até essa casa vizinha com as recomendações de mamãe de não amassar a camisa. João Batista Castanho cita no seu livro que a vizinhança era excelente e deixou marcas indeléveis de verdadeiras amizades. Posso confirmar que o contrário também é verdade, pois os membros da família de Accacio e Joana Castanho deixaram saudades quando mudaram de nosso bairro. Anos depois o seminarista e depois diácono José Carlos se ordenou padre pela imposição das mãos de Dom José Carlos de Aguirre. Hoje é Bispo Emérito e mora em Sorocaba. Monsenhor Castanho é o saudoso tio historiador e padre que usava o pseudônimo de Aluísio de Almeida em seus inúmeros livros publicados.

João Batista Castanho Sobrinho casou com Maria José de Barros Castanho( Mazé) e tiveram os filhos Milton de Barros Castanho (in-memorian) Eliana de Barros Castanho Nóbrega de Almeida, Eugênio Carlos de Barros Castanho, Mônica de Barros Castanho, Eduardo de Barros Castanho e Maria Cristina de Barros Castanho Stecca. São nove netos e quatro bisnetos que alegram a família.

No dia 1º de dezembro de 2020 a Maria José, eterna amada do “Tista”, o João Batista Castanho Sobrinho, sua namorada desde a juventude em Guareí, deixou saudades eternas para estar com Deus. Os três livros com título Guareí, Monsenhor Castanho e Dom Castanho faz parte a Coleção Guareí, Nossa, Vida e Raízes. O e-mail de João Batista Castanho Sobrinho para contato sobre os livros, ainda não publicados, é: [email protected]

Vanderlei Testa é jornalista e publicitário. Escreve às terças-feiras no Jornal Cruzeiro do Sul e aos sábados no www.blogvanderleitesta.com e www.facebook.com/artigosdovanderleitesta