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Que fazer com o ‘diabinho’ dentro de casa?

07 de Agosto de 2019 às 00:01

Mário Cândido de Oliveira Gomes

Se você tem dentro de casa uma criança agitada, inquieta, agressiva, impulsiva, com apelidos variados, como diabinho, azougue etc, está na hora de você conhecer o problema e pedir orientação médica. A criança saudável é sempre agitada, mas quando a hiperatividade começa a interferir na capacidade de concentração e de atenção, os pais devem pensar no Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH). Tal problema atinge de 3% a 6% da população infantil mundial, precisando de diagnóstico e acompanhamento precisos.

O primeiro a desconfiar da enfermidade é o pediatra, que deverá encaminhar a criança para o especialista. O transtorno acompanha os portadores de hiperatividade para o resto da vida em 50% a 70% dos casos se não forem tratados. Esses indivíduos são tidos como irresponsáveis, abandonam a escola precocemente, fugindo dos compromissos maiores e dos trabalhos mais exigentes. Também foi demonstrado que o portador de TDAH é o maior usuário de drogas. Por outro lado, quando tratados na infância têm muito menor chance de trilhar o caminho da marginalidade.

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O TDAH consiste num conjunto de manifestações, como agitação, falta de concentração, inquietação, dificuldade de aprendizado, tornando-se uma criança com baixa produtividade na escola, no lazer e na vida familiar. O transtorno não tem confirmação laboratorial e também não existe nenhuma estrutura lesada no cérebro para comprovar o problema. Por isso o diagnóstico é feito pela observação do comportamento e aplicação de questionários. O fundamental é que tais sintomas começam sempre antes dos seis anos de idade.

Quanto à causa do transtorno já se falou de tudo, mas o componente genético é considerável, embora ocorra nos filhos adotivos. Também é importante o tabagismo materno durante a gestação. Atualmente sabe-se que os impulsos são reprimidos no lobo frontal do cérebro, à custa de substâncias como a dopamina e outros neuro-hormônios. Quando há falha no mecanismo de repressão dos impulsos surge a hiperatividade.

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O TDAH vai desde o agitado total, que destrói tudo, até aquele que fica próximo da normalidade. A diferença é que o hiperativo se comporta desta forma em todos os lugares, isto é, não tem autocontrole, enquanto a criança levada funciona diferente em alguns lugares. O TDAH pode ser confundido com outras enfermidades que cursam o rumo da hiperatividade, como oposição à autoridade, transtorno bipolar (depressão) etc. A hiperatividade pode ser agravada pela falta de orientação dos pais na compreensão do “impor limites”, quando dizem “não” para tudo. Assim agindo, chegam ao extremo de ofender, maltratar e expor a criança a situações que podem causar mais dano do que o próprio TDAH. Como, por exemplo, danos à autoestima, à confiança e à autoimagem da criança. A intervenção do especialista é fundamental para orientar os pais na condução do problema, falando de forma correta com a criança para evitar problemas futuros, além de medicação paradoxalmente psicoestimulante. Assim, quando os pais percebem que a criança apresenta dificuldade de relacionamento, como não ser convidada para festinhas, ser evitada pelos amiguinhos, receber apelidos do tipo “diabinho” ou é convidada a mudar de escola, está na hora de orientação profissional. Caso contrário, a falta de autoestima, autoimagem ruim, dificuldade de se controlar (impulsividade e agressividade) pode desembocar no caminho da marginalidade, principalmente pela oposição sistemática à autoridade ou para se sentir importante. Como diz um psiquiatra: “A vida é como uma novela e os primeiros capítulos é que vão determinar a sequência do enredo; se o início for ruim, o final também não deve terminar bem.” Realmente, nos primeiros cinco anos de idade a criança recebe informações que vão criar seu processo de vida. A grande mudança do “enredo” é o tratamento precoce do TDAH. Os pais devem ser orientados para instalar na criança confiança e segurança, para que mais tarde não vivam “enredos equivocados”.

Artigo extraído do livro de Doenças - Conhecer para prevenir (Ottoni Editora), de autoria do médico Mário Cândido de Oliveira Gomes, falecido aos 77 anos, no dia 6 de junho de 2013.