Adotar ou não adotar o lockdown em São Paulo
Celso Ming
Até amanhã, o governador de São Paulo, João Doria, e o prefeito do município de São Paulo, Bruno Covas, terão de decidir se decretam ou não o isolamento radical da população, o lockdown, como procedimento destinado a enfrentar o novo coronavírus.
Será quarta-feira porque no dia 31 de maio se esgota o prazo dos decretos que impuseram a quarentena e é preciso saber o que vem depois.
Epidemiologicamente, esta parece a melhor opção, diante do agravamento da crise e do aumento do risco de colapso do sistema público de saúde. No Estado, até esta sexta-feira, já são mais de 76 mil infectados e 5,7 mil mortes, os leitos de UTI estão com ocupação de 75% no Estado e de 91% na Grande São Paulo.
Antes de mais nada, é preciso saber se o lockdown não viria tarde demais e até que ponto poderia funcionar. E, se não funcionar, saber se os resultados não poderiam ser piores do que se o isolamento simples fosse mantido. Não há resposta conclusiva para essas perguntas.
A população não parece motivada a enfrentar o bloqueio de circulação. Cerca de metade das pessoas não vem observando nem sequer a quarentena, em parte porque está cansada do isolamento e, também, porque precisam tratar de arrumar algum sustento.
Nova pergunta: Confinar os moradores das periferias às suas casas não produziria efeito mais nocivo, o de infectar mais rapidamente os mais pobres, os que não dispõem de condições mínimas de higiene para se proteger?
Só na Grande São Paulo são 21,5 milhões de habitantes.
Por aí se vê que se for para adotar a saída radical, será preciso engajar todos os prefeitos da região e não apenas o do município de São Paulo. Qual seria o índice de sucesso de uma operação de lockdown? Elevar de 60% a 70% o confinamento poderia reduzir o número de mortos e o nível de utilização dos leitos de UTI? O que garantiria esse sucesso numa cidade que não conseguiu nem sequer bloquear meia dúzia de avenidas nem manter por apenas uma semana o rodízio de 24 horas nos veículos?
Para exigir a observância do lockdown, seria preciso garantir punições severas para infrações. Que tipo de punição poderia ser usada? Prender os transgressores, quando as autoridades vêm fazendo o contrário e vêm soltando presos para evitar o alastramento da contaminação nos presídios? Ou aplicar multas sobre quem não tem dinheiro nem para se alimentar?
Além disso, não deixam de ser limites incontornáveis à eficácia de um isolamento radical o funcionamento de supermercados, feiras livres, farmácias, postos de gasolina, bancas de revistas e oficinas de reparo de veículos.
Além disso, o mercado financeiro não pode parar, a Bolsa tem de seguir os mercados internacionais, os bancos precisam permanecer abertos, os portos e os corredores de acesso e de saída de mercadorias não podem fechar.
Ah, sim, as autoridades poderiam optar por um lockdown seletivo. Nesse caso, que critério adotar? Por idade, por localização geográfica? E como administrar a obediência a essa decisão? Por tudo isso, se vê que tanto o governador como os prefeitos terão de optar por saídas de enorme gravidade sem clareza do que estão decidindo.
Celso Ming é jornalista especializado em Economia e escreve para a Agência Estado.