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A prevenção de resíduo sólido e a busca pelo consumo responsável

11 de Setembro de 2019 às 00:01

Ana Paula Bortoleto

O princípio da prevenção é prioritário e preferencial na gestão do resíduo sólido, como em qualquer outra questão ambiental. Sem dúvidas, prevenir é melhor que remediar. Prevenir significa não procurar soluções de valorização, tratamento ou disposição do resíduo sólido. Prevenção é a ausência da geração de resíduo sólido. Ora, se prevenir implica uma ação antecipada, o que era o resíduo sólido doméstico antes de se tornar resíduo? Eram objetos que foram produzidos, distribuídos, vendidos, comprados e usados que, por uma decisão de cada cidadão, perderam os seus valores de uso e suas funções, se tornando algo não desejável. A prevenção deve atuar, assim, em todas as fases do ciclo de vida do produto e envolve a responsabilização tanto dos produtores como dos consumidores.

O setor produtivo possui uma ampla ação ao que produz, como produz, quanto produz e para quem produz, que acarreta para si uma responsabilidade proporcionalmente maior quando comparado aos consumidores. Entretanto, a ação coletiva dos consumidores possui influência indireta neste setor e determina o foco das políticas públicas de resíduo sólido. A responsabilização do cidadão como consumidor inicia-se no ato da compra. É neste momento que ele decide dizer sim ou não à geração de resíduo sólido, aceitando ou rejeitando o produto em função do seu uso e eliminação futura. Essa ação pode significar uma mudança na estratégia produtiva e, consequentemente, no ciclo de vida do produto.

O consumo responsável não possui uma única definição. É tornar o ato de consumo uma prática de cidadania. Significa comprar produtos que não envolvam a exploração de seres humanos, animais e não causem impactos ambientais negativos. Significa entender o efeito de uma compra em todos os seres vivos durante todo o ciclo de vida daquele produto. De uma forma mais abrangente, é entender que o ato de consumir tem reflexos econômicos, ambientais e sociais. Por fim, o consumidor responsável é o cidadão que utiliza suas escolhas para intervir positivamente na sua realidade social e ambiental, transformando o seu ato de consumo.

A prática do consumo responsável varia de acordo com o contexto local onde o cidadão reside. Contudo, é fácil verificar que suas diferentes práticas se baseiam, em sua maioria, em ações colaborativas entre produtores, organizações não governamentais, associações e consumidores. Embora essas ações colaborativas sejam de extrema importância, a inação do poder público na regulamentação do consumo responsável dificulta ações mais efetivas de prevenção de resíduo sólido. Para o cidadão gerar menos resíduo sólido, ele precisa entender como consumir responsavelmente. E para ele entender o seu ato de consumo, é necessário que ele tenha o direito de: 1) de conhecer o produto quanto a sua performance ambiental e social, 2) de escolher, 3) de comprar menos e 4) de não comprar. A primeira condição se refere ao direito à informação sobre o produto quanto aos seus impactos ambientais e sociais. A segunda, se refere à escolha de produtos que geram menos resíduo e isso implica disponibilidade e igualdade de concorrência econômica. Já a terceira condição discute a durabilidade dos produtos e a garantia de manutenção efetiva e fácil pelos seus produtores. A quarta, por fim, garante ao consumidor satisfazer as suas necessidades sem consumir o produto através do seu empréstimo por um determinado período ou o seu aluguel via contratos de prestação de serviços ou pela revenda de produtos usados.

Em suma, para diminuirmos efetivamente a geração de resíduo sólido doméstico e os seus impactos, precisamos caminhar para um novo sistema de consumo onde a responsabilização será a necessária mola propulsora e caberá ao poder público, dentro de suas três esferas, promovê-lo adequadamente visando práticas ambientais e sociais em direção a uma sociedade mais sustentável que a atual.

Ana Paula Bortoleto é engenheira civil e professora-doutora do Departamento de Infraestrutura e Ambiente da Unicamp, responsável pela gestão de resíduo sólido.