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A possibilidade de cura para a dor crônica

19 de Junho de 2019 às 00:01

Mário Cândido de Oliveira Gomes

Existem pessoas que sofrem constantemente de dor. Sai dia, entra dia, e a dor persiste. Algumas chegam a esquecer do problema por falta de resolução, outras perambulam pelos consultórios médicos atrás de um bálsamo para seu infortúnio. Em geral os indivíduos dizem: “O que não tem remédio, remediado está”. Porém, não é bem assim para quem sofre de dor crônica, pois, a esperança é a última que morre. A preocupação da comunidade médica com o tratamento dos portadores de dor crônica começou após a Segunda Guerra Mundial devido às dores persistentes dos ex-combatentes. Entre nós, um grande avanço foi a criação de programas e centros de dor, constituído por equipes multidisciplinares, com a tarefa de indicar técnicas, medicamentos e terapias individuais.

A explicação do problema é antiga. Por volta de 380 a.C. o filósofo grego Platão classificou a dor como uma experiência do corpo e da alma. Na atualidade, os cientistas têm comprovado que a dor crônica não é estimulada somente por sensores nervosos, mas um complexo que envolve emoções, memória e até hormônios. Em geral são indivíduos estressados, metódicos, perfeccionistas, compulsivos nas atividades e que adoram assumir todos os problemas da família, dos amigos, dos vizinhos, etc. Também são extremamente ansiosos, com distúrbios de sono e falam sempre as mesmas frases e expressões. Por isso é mais comum nos idosos com idade avançada, em mulheres e em trabalhadores braçais, pelas atividades repetitivas.

As pessoas que tiveram uma infância perturbada, estressante e com graves problemas familiares estão mais sujeitas à dor crônica. O fator psicológico também é importante, sendo responsável pelo desencadeamento das crises e maior sensibilidade à dor. Os portadores de dor antiga e constante apresentam alteração de substâncias denominadas neurotransmissores (serotonina, noradrenalina, etc), que são responsáveis pela condução do fluxo nervoso.

A dor crônica atinge 30% da população mundial, segundo a Organização Mundial de Saúde. Entre nós, como sempre, não há dados seguros, mas a tendência é seguir os números da OMS, o que equivale a mais de 50 milhões de portadores. Diferente da dor aguda, que é passageira e serve de alarme, a crônica é de tratamento difícil e não apresenta finalidade biológica. Assim, “pode se manter por muito tempo, não acompanhar uma enfermidade já diagnosticada, ter um componente emocional importante ou aparecer meses após a cura de um problema inicial”. Por isso o diagnóstico e o tratamento dependem da boa comunicação ou entrosamento do paciente com o médico. Entre as dores consideradas crônicas estão as dores de cabeça, dores lombares, artrites, hérnias de disco, fibromialgia e as neurites. O diagnóstico é geralmente clínico, dispensando exames de laboratório, embora muitas vezes não seja possível definir a causa. Existem pessoas que sofrem durante anos em silêncio ou até a vida inteira, sem saber que são portadoras de uma enfermidade com possibilidade de cura. Todavia, não existem tratamentos milagrosos e de resolução rápida. Ao contrário, exigem acompanhamento por toda a vida, despertando cansaço e desgaste na relação médico/paciente.

A abordagem é sempre multidisciplinar, envolvendo áreas fora da medicina, como psicologia e fisioterapia. Também existem síndromes dolorosas que podem ser curadas em até 90% e outras em que só é possível reduzir os sintomas com medicamentos (opióides, antidepressivos, antiinflamatórios e anticonvulsivantes), atividade física e mudanças no estilo de vida. Também existe uma terapia chamada Biofeedback, que utiliza um programa de computador para ajudar o paciente a reconhecer algumas das reações do organismo, como estímulos musculares, temperatura e frequência do coração, permitindo aliviar os sintomas. Na solução do problema “é fundamental a cumplicidade do profissional com o portador de dor crônica, para mostrar que existe uma vida com qualidade além da dor”.

Artigo extraído do livro Doenças - Conhecer para prevenir (Ottoni Editora), de autoria do médico Mário Cândido de Oliveira Gomes, falecido aos 77 anos, no dia 6 de junho de 2013.