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A judicialização e os impactos na administração pública

04 de Novembro de 2018 às 08:57

A teoria da separação de poderes é a base do nosso direito constitucional. Por esse princípio, os poderes do Estado se dividem em Poder Legislativo, Executivo e Judiciário. A justificativa da separação pode ser definida, de acordo com Montesquieu, um dos mais importantes filósofos e pensadores do iluminismo francês, a de que, com ela, cada poder tem a possibilidade de impedir abusos de um sobre o outro, em um sistema conhecido como de freios e contrapesos. Antes de existir essa separação, prevalecia a desorientação dos poderes. Com o decorrer dos anos, os Estados passaram a acolher a doutrina proposta por Montesquieu, criando uma independência entres esses poderes e, para que um possa impedir os descomedimentos do outro, passaram a dispor de garantias constitucionais.

Acontece que, nos últimos anos, sobretudo no Brasil, houve, conforme descreveu o ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), em uma palestra proferida em agosto de 2016, o “fenômeno da judicialização da vida de maneira geral”. Para ele e para nós, o Poder Judiciário ganhou certo protagonismo a partir da passagem da Constituição para o centro do sistema jurídico e da constitucionalização do direito, o que pode ser bom, mas também tem seus aspectos ruins.

Senão, vejamos: estão se tornando cada vez mais comuns casos em que juízes proferem sentenças que obrigam prefeitos e até governadores a contratar profissionais em diversas áreas, como na Educação, entre os quais professores e auxiliares, além de vagas em creches. Na Saúde, são outras centenas de ações para que a Prefeitura seja obrigada a fornecer medicamentos e atendimentos de home care, atribuições que muitas vezes não são de responsabilidade da administração municipal.

Para se ter ideia, reportagem publicada na edição 2018 do “Anuário da Justiça - São Paulo” destaca que o Tribunal de Justiça de São Paulo julgou, em um ano, mais de 40 mil casos tendo como objeto a saúde. Da falta de um remédio simples em um posto de saúde público à autorização para uma complexa cirurgia fora do país, juízes e desembargadores lidam diariamente com enorme variedade de pedidos.

A expansão da judicialização tem preocupado gestores e mesmo parte de juristas, pois, sem critérios, pode conduzir a um desequilíbrio do orçamento, prejudicando políticas públicas já avençadas, afetando inclusive a Lei de Responsabilidade Fiscal.

Quando se debate sobre a Judicialização, um ponto de grande importância é a questão dos limites entre direito individual e direito coletivo, isto é, o uso da via judicial para solicitar os mais diversos serviços, entre os quais na área da saúde, o atendimento médico, medicamento, insumos, exames, entre outros. O Sistema Único de Saúde, por exemplo, foi criado com princípios de universalidade, igualdade, equidade etc. e, ainda, a Constituição Federal reza que a saúde é um Direito de todos e um dever do Estado e, diante disso, há na questão da judicialização um ponto de conflito, pois as demandas judiciais acabam por beneficiar o direito individual, afetando a coletividade e acarretando significativos gastos aos cofres públicos. Ou seja, a judicialização se torna um malefício, pois privilegia o Individual sobre o Coletivo, dilapidando verbas que deveriam promover benefícios a milhares e não apenas alguns.

Sorocaba não é diferente e tem sofrido os impactos dessas decisões. Apesar disso, a nossa administração tem intensificado as ações e projetos visando a melhoria da qualidade de vida e a ampla garantia de acesso aos serviços públicos. Tanto que, recentemente, o Índice de Desafio da Gestão Municipal (IDGM) aponta Sorocaba como a 13ª cidade, entre 100 grandes -- incluindo capitais -- que mais investe com prestação de serviços ao cidadão. Outra importante ação que pretendemos implementar é a contratualização dos serviços nos setores da Educação e Saúde, que acreditamos deverá contribuir para a melhoria da qualidade e a ampliação dos serviços oferecidos, sem que o prejuízo da judicialização seja um impeditivo.

José Crespo é prefeito de Sorocaba.