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A imagem vale mil palavras

08 de Setembro de 2019 às 08:09

Presidente Jair Bolsonaro. Crédito da foto: Evaristo Sa /AFP (29/08/2019)

Carlos Brickmann

Bolsonaro, na sexta, concedeu 12 aeroportos. Há investidores, portanto, acreditando que não haverá mudança nas regras do jogo e que suas apostas são seguras, poderão dar lucro. Disse o presidente que seu governo “está recuperando a confiança do país”. É aí que se engana: embora, em pouco menos de nove meses, tenha adotado boas medidas, que agradaram ao mercado, o grande problema de seu governo é a desconfiança de que é alvo.

Não sou bolsonarista, nem petista, nem comunista. Sou jornalista. Quem quiser xingar que xingue, mas o jornalismo é crítico e desconhece aliados.

Bolsonaro obteve a reforma da Previdência, que em algum tempo irá aliviar o déficit fiscal, o Congresso deve fazer a reforma tributária, e com apoio dos governadores (a nova distribuição de impostos pode prejudicar alguns Estados), os juros oficiais jamais estiveram tão baixos, o que também irá contribuir para aliviar o déficit, o tratado União Europeia-Mercosul, que levou 20 anos de negociação, foi assinado (ainda falta que os parlamentos o aprovem), a BR, distribuidora da Petrobras, sai do colo estatal. O quadro é bom -- mas o líder da oposição é o aguerrido Jair Bolsonaro. Seus rompantes ganham mais destaque do que suas conquistas. O Brasil nada ganha quando o presidente e o cordão que cada vez aumenta mais dizem que a mulher de Macron é feia, ou que nazismo é de esquerda. O governo tem aspectos positivos, não só negativos, mas a imagem é ruim. E imagem é o que se vê.

Problema interno

Toda a equipe do Ministério Público Federal que trabalha na Lava Jato se afastou. Sérias divergências, não rebelião: não se fez nada fora da lei. Os lavajatistas não queriam que Raquel Dodge ficasse na Procuradoria-Geral da República, mas também não gostaram de Augusto Aras, escolhido por Bolsonaro. Queriam que o escolhido estivesse na lista tríplice enviada por eles -- à qual Aras não concorreu porque a lista não é prevista em lei e por achar que o MP não deve ser uma corporação fechada que indica os próprios dirigentes. O STF, comenta-se, gostou de Aras. Moro não deve ter gostado -- é lavajatista. Mas nem foi consultado. Silenciou: o superministro é mais Clark Kent do que súper. Quais as consequências do desagrado dos procuradores? Talvez nenhuma: deixaram os cargos onde há poder.

Problema futuro

Na Polícia Federal, aguarda-se a demissão, por Bolsonaro, do diretor-geral Mauricio Valeixo, da confiança de Moro. Para seu lugar, fala-se no secretário da Segurança de Brasília, Anderson Torres. E Moro? Gente que o conhece desde que era estagiário acha que vai aguentar tudo: acreditam que tem um objetivo e engolirá sapos até atingi-lo. Bolsonaro mostrou que para ele Moro já rendeu o que tinha de render. Se ficar, tem de obedecer e olhe lá.

Um aceno...

Mas Bolsonaro faz acenos públicos de deferência a Moro e à Lava Jato. Fez mais do que pediam: em vez de vetar nove ou dez dispositivos, vetou 36. De acordo com os vetos, o juiz que mandar prender alguém em manifesta desconformidade com a lei e as provas não terá punição. Deixa de ser crime violar direitos ou prerrogativas de advogados -- inviolabilidade do escritório, por exemplo. Numa busca e apreensão, pode-se apreender os computadores e será violado o sigilo de todos os clientes sem ordem da Justiça. Continua sem punição a execução de decisões judiciais “de forma ostensiva ou desproporcionada”. Quando o juiz quiser ouvir alguém, se a Polícia o prender com escândalo, para desmoralizá-lo perante os vizinhos, não haverá o que punir. Punição para o uso irregular de algemas -- vetado em súmula do STF -- deixa de existir na lei. Cenas como a de Sérgio Cabral algemado por mãos e pés, pela lei que Bolsonaro sancionou deixam de ser crimes.

... em vão?

Só que a lei foi aprovada por ampla maioria. E há fortes possibilidades de que os vetos sejam todos rejeitados. Se Bolsonaro tivesse vetado cinco ou seis dispositivos, as chances de negociação seriam grandes. Com 36 vetos, é provável que o Congresso derrube tudo e restaure a lei como foi aprovada.

Carlos Brickmann é jornalista. E-mail: [email protected]