José Osmir Fiorelli
Periscópio 4 — guimbas e lanches
Comuns as lanchonetes próximas de entidades de ensino. Desempenham importantes papéis: locais para descontração, prática de companheirismo, troca de ideias. Jovens, em especial, agitam-nas. Serviços rápidos, simples, objetivos, relativamente baratos.
Observo, com regularidade, pequenos grupos a conversar nesses locais. Sempre a curta distância dos estabelecimentos em que estudam. O clima de Sorocaba, em geral ameno, parece contribuir para consolidar o costume.
Muito apreciadas as lanchonetes que dispõem de mesas “ao ar livre”. Os frequentadores parecem ignorar a poluição sonora (assegurada pelas motocicletas e veículos pesados) e a fumaça emitida pelos automóveis e caminhões.
Desses estabelecimentos exige-se apenas o essencial. Lanches, bebidas com ou sem álcool, gelados, atendimento ágil suprem as necessidades mínimas para que um ponto se torne atrativo local de encontro regular.
As conversas fluem, impulsionadas pela gastronomia simples e identidade de perfis comportamentais: idade e interesses similares unem esses gregários moços e moças.
Algumas questões, entretanto, geram estranhamento aos observadores mais atentos.
Em pleno horário de aulas, formam-se grupinhos de conversa. Os uniformes denunciam a presença de estudantes. Saem dos estabelecimentos de ensino e reúnem-se.
Nas calçadas fronteiriças espalham-se resíduos não literários da conversação, principalmente quando se situam ao lado das mesas.
Sobre a grama e o piso espalham-se as populares “guimbas”, acompanhadas de tampinhas de cerveja e refrigerante, além de pequenas embalagens (sorvete, chicletes).
Essas condições contribuem para se desenvolva uma imagem pouco lisonjeira a respeito da educação dos frequentadores. Ela agrega dois fatores adversos: o consumo de bebida alcoólica e tabaco, porta para o deletério hábito, e o comportamento indicativo da precariedade de suas educações.
Esses dois fatores se integram. O observador fica induzido a imaginar os estúrdios ambientes domésticos em que vivem esses jovens. Afinal, educação e vício constituem questões tipicamente familiares. Não constituem responsabilidades das entidades de ensino, obviamente, embora lhes caiba monitorar a permanência dos alunos.
A mocidade constitui etapa crucial para a existência. Cada hora desperdiçada nesse período, advertia Napoleão (1769 — 1821), representa uma possibilidade de sucesso a menos na vida.
Trata-se do período em que as pessoas se preparam para deixar os lares e construir suas vidas. Nela se solidificam amizades que persistirão. Eventualmente, as mais sólidas e significativas! Também na mocidade desenvolvem-se hábitos e preferências que se farão presentes no trabalho, no lazer, na vida familiar e influenciarão decisivamente nas escolhas futuras.
Para ser bem usufruída e permitir que as melhores sementes germinem no solo fértil da seara para a vida adulta, a mocidade requer que se busque a excelência nos mais diversos aspectos: princípios, valores, comportamentos. Com uma grande vantagem: a pessoa ainda se encontra sob a proteção familiar, o que lhe possibilita investir o máximo de energia em seus projetos.
Comportamentos, princípios e valores inadequados cobrarão, de quem os pratica e comunga, elevados custos ao longo da vida.
Na sociedade contemporânea verifica-se, a miúdo, a presença de jovens carentes de objetivos e orientações. Pouco propensos a enfrentar desafios significativos. Demonstram esquecer-se de que as estruturas parentais que os suportam podem ser mais frágeis do que imaginam.
Quando se unem nas lanchonetes, os jovens buscam apoiar-se mutuamente. Contudo, receia-se que os conteúdos de ensino e aprendizagem, as prospecções a respeito do futuro e de decisões essenciais, pouco frequentem suas conversas.
As incertezas e experimentações encontram hora e vez no transcorrer da juventude.
Espera-se, contudo, que não tragam sequelas psíquicas. A drogadição, por exemplo, espreita nos desvãos dos escorregões comportamentais.
Incomum, nesses locais, pais e filhos a compartilhar um lanche. Possivelmente, a ambiência pouco favorece essa condição, também dificultada pela falta de tempo, tão característica da atualidade (agora que a tecnologia propicia tudo o que se pode imaginar para poupá-lo e aproveitá-lo!).
Nas sábias palavras de Frei Antônio das Chagas (1631 — 1682): “Aqueles que sem conta gastam tempo; Quando o tempo chegar de prestar conta; Chorarão, como eu, o não ter tempo.”
O tempo, sempre, é um juiz implacável, não afeito a remissões a qualquer título. As promissórias da juventude serão descontadas a seu devido tempo.
José Osmir Fiorelli é engenheiro, psicólogo, escritor. Sócio emérito da Academia Sorocabana de Letras.