João Elias
O poder do placebo e a sabedoria da consulta médica
Qual o papel do médico numa consulta, além do seu conhecimento específico? Existe algo imponderável que vai muito além do tratamento prescrito. Digo isso porque a prescrição de medicamentos ou a solicitação de exames não são necessariamente obrigatórias numa consulta médica.
O clínico também se vale de uma série de informações sobre o paciente, obtidas em uma breve e bem conduzida anamnese. Superada essa etapa, começa a fase de exploração dos sintomas, onde o médico mede parâmetros, faz auscultas e testa reflexos, entre outros procedimentos.
O médico como conselheiro
Se não há indicação de medicalização ou exames, o clínico assume o papel de grande conselheiro e “prescritor de sabedoria”. O paciente, sentindo-se acolhido, leva consigo a credibilidade do médico, que se torna um conselheiro de confiança.
No entanto, mesmo quando há prescrição de medicamentos, o efeito da confiança entre médico e paciente desempenha um papel fundamental, conhecido como efeito placebo. O efeito placebo costuma ser associado a medicamentos sem princípios ativos, como os homeopáticos ou florais de Bach. A eficácia deles depende da sugestão e da crença, especialmente se houver empatia entre o médico e o paciente. É por essa razão que uma consulta homeopática, não raro, dura mais de uma hora.
O efeito placebo na ciência
O termo “placebo” também é utilizado para medicamentos alopáticos sem princípio ativo, usados em pesquisas clínicas para verificar a eficácia de novos tratamentos. Esse conceito tem sido empregado de forma mais ampla para destacar a importância da empatia na consulta e sua influência na adesão ao tratamento. Muitos pacientes não seguem o tratamento por considerarem a conduta do médico “errática e de pouca confiança”.
O efeito placebo é como o beijinho da mãe no joelho ralado do filho: ele acalma a dor, ajuda a cicatrizar e evita o desespero da criança. Neste ato simples, há uma importante carga do efeito placebo positivo do médico.
A origem da terapia e o “duplo cego”
Josef Breuer, um dos precursores da psicanálise, observou que os católicos se confessavam na igreja e saíam aliviados. De forma superficial, essa observação está na origem da terapia, que Sigmund Freud aprofundou e que resultou em inúmeros dissidentes.
Outra curiosidade sobre o placebo vem do chamado “duplo cego”, um método de pesquisa que compara novos medicamentos com placebos. Por exemplo, no caso do sildenafil (Viagra), um medicamento indicado para hipertensão arterial, a equipe de pesquisa notou que homens submetidos ao princípio ativo se recusavam a devolver as amostras. Ao investigar, psicólogos clínicos da equipe descobriram que eles não queriam devolver o medicamento porque seu desempenho sexual havia melhorado.
Foi assim que se criou uma categoria de medicamentos, para disfunção erétil. Este é um caso em que um efeito colateral se tornou mais relevante que o propósito original do medicamento.
Enfim, entre placebos e efeitos colaterais, quase todos foram salvos.
João Elias ([email protected]) é farmacêutico bioquímico, sócio efetivo da Academia Sorocabana de Letras, membro do Clube de Leitura de Araçoiaba da Serra (Clas).