Celso Ming
É o tarifaço de Trump. E agora?

Quem afirma que sabe o que vai acontecer daqui para a frente na geopolítica e na economia mundial é porque não sabe. Pode dar palpite ou fazer uma aposta, mas não passará certezas.
Começa por não se saber o que é para valer na metralhada produzida todos esses dias pelo presidente Donald Trump. Ele já mostrou que é de atacar primeiro e perguntar depois. Mas parece que já demonstrou que sabe o que é tiro no pé, porque também começa a suavizar seu jogo duro.
Além de encarecer o produto importado pelos Estados Unidos, uma ampla guerra comercial tenderia a desarticular os fluxos globais de produção e distribuição o que, por si só, seria fator de aumento de custos. Os empresários dos Estados Unidos parecem perdidos, sem saber ao certo o que têm a fazer. Em vez de atrair investimentos, a incerteza pode afugentá-los para países menos expostos às avalanches comerciais.
Alguns comentaristas entendem que Trump optou pelo ajuste via inflação. Seria o que poderá reduzir em termos reais a superdívida dos Estados Unidos, desvalorizar o dólar, achatar os salários e proporcionar mais arrecadação (imposto inflacionário). Mas sabe que mais inflação corrói o apoio popular. É considerada uma das principais causas da derrota fragorosa dos democratas nas últimas eleições. E tem o Fed (banco central dos Estados Unidos), que está pronto para aumentar os juros, apesar das pressões contrárias de Trump. Mais juros tendem a provocar desaceleração da economia ou, até mesmo, recessão. Além disso, atirariam à inadimplência os devedores, e entre eles, os amarrados a hipotecas.
Se o ajuste pela inflação vier a ser consequência importante, não terá sido por estratégia programada. Trump quer alcançar o sol, mas não parece preparado para isso. Dá a impressão de que dispõe apenas de asas grudadas com cera, como Dédalo, que despencou lá de cima, quando o calor derreteu a cera.
O Brasil parece menos vulnerável à guerra comercial de Trump porque exporta menos do que importa dos Estados Unidos. Em 2024, por exemplo, registrou saldo comercial negativo de US$ 283 milhões.
Também tem como tirar proveito das represálias impostas por China, Canadá, México e União Europeia, que podem aumentar a demanda por produtos brasileiros, especialmente commodities. Mas não dá para garantir esses benefícios.
O problema aí é que a qualidade do argumento do lobo não tem importância quando ataca o cordeiro. Vale qualquer pretexto, por mais esfarrapado que seja. Impõe tarifaços porque alega entrada de fentanil pela fronteira; ou porque facilita a entrada de imigrantes ilegais; ou porque está sob influência da China, como o Panamá; ou, ainda, porque tenta negociar com outra moeda que não seja o dólar, como os países do Brics.
Melhor não peitar a fera, como Zelenski. Melhor enfrentá-la sem gritaria e com jogo de cintura, como tem feito a China.
Celso Ming é comentarista de economia.