João Alvarenga
Na sintonia da saudade

Embalado pelo ritmo das antigas marchinhas carnavalescas, revisitarei, hoje, o passado do nosso País, como forma de trazer às novas gerações um pouquinho do cotidiano de antigamente. Algo bem distante da tecnologia de que dispomos atualmente. Talvez, aqueles que estejam na faixa dos 60+ sejam tomados por uma inevitável onda de nostalgia. Pois, a referência será o espetáculo Rádio Teatro Sintonia — um amanhecer para Lígia, em cartaz no auditório Pedro Salomão José, anexo à Escola Municipal Getúlio Vargas. Com entrada franca, sempre aos fins de semana, até o dia 16 de março, tal montagem emociona o público, graças à exímia reconstituição de época, trazendo ao público resquícios de um passado encantador.
Desse modo, esse belo espetáculo será nosso “teletransporte” para embarcarmos juntos, numa pequena viagem que faremos às primeiras décadas do século 20, através deste artigo. Época em que o relógio era analógico e dava a impressão de que não corria tanto como agora, neste mundo digital. Tudo parecia mais simples. Ninguém era capaz de supor que, um dia, ouviríamos falar em Inteligência Artificial. Brincar na rua e ir às matinês, aos domingos, era a diversão da geração do meu tempo. Até a escola tinha sabor de diversão.
Você que não viveu isso, depois da leitura, ouça a marchinha As pastorinhas, na voz da saudosa cantora Elizeth Cardoso. Então, por alguns minutinhos, feche os olhos e tente imaginar como era esse passado que não volta mais. Se a ideia é lembrar os tempos de outrora, é inevitável não trazer à tona a imagem das famosas cantoras do rádio que tanto sucesso fizeram: Dalva de Oliveira, Emilinha Borba, Lidinha Batista e Carmen Miranda, a Pequena Notável. Logo, não se pode negligenciar a significativa importância que o rádio teve (e tem) na vida deste País.
Afinal, como evidencia a montagem teatral, por mais de três décadas esse singelo meio de comunicação, inventado pelo injustiçado padre gaúcho, Roberto Landell de Moura, reinou, de forma absoluta, como o principal meio de informação e de descontração da população, pois estava presente em quase todos dos lares, das favelas cariocas às mansões das áreas nobres.
Para não gerar dúvida, a palavra “injustiçado”, empregada no parágrafo anterior, justifica-se, porque a História, infelizmente, não reconheceu a figura do padre como o inventor desse que se tornaria um dos principais veículos de comunicação do planeta. Detalhe: o biógrafo do padre, Hamilton Almeida, é detentor de documentos que atestam a autenticidade do invento de Landell. Registram afirmam que, no dia 16 de 1899, Landell fez a primeira transmissão radiofônica. Ou seja, 23 anos antes da oficial. Infelizmente, o padre não tinha dinheiro para patentear a invenção. “Landell é um gênio esquecido”, lamenta.
Apesar disso, antes das telenovelas conquistarem a preferência nacional, as radionovelas, como bem mostra o espetáculo — um misto de encenação com quadros musicais dominaram os anos 30, 40 e 50, durante a chamada “Era de Ouro” do rádio. Naquela época, as famílias brasileiras se reuniam, na sala, para ouvir as empolgantes “radionovelas”, que tanto encantavam os radiouvintes. A criatividade era a marca dos roteiristas. Além dos dramalhões, também eram apresentados outros estilos, que prendiam a atenção de todos. Em Sorocaba, destacou-se a figura do saudoso Ulderico Amêndola, brilhante radioator. Atualmente, a Rádio Boa Nova mantém esse gênero no ar, com ênfase às histórias espíritas.
Da infância, recordo que, em casa, ouvíamos, pela Rádio Difusora de Itapetininga, às sextas-feiras, às 22h, o quadro Rádio Mistério, com narrativas assustadoras. Além do noticiário e transmissões esportivas, a programação contemplava os programas de auditório, que faziam a festa da plateia, pois essas apresentações eram ao vivo. Ou seja, o candidato tinha que ter bom “gogó” para não desafinar. Bom domingo!
João Alvarenga é professor de redação.