Marcelo Augusto Paiva Pereira
Urbanismo rodoviarista

A matéria publicada na página 5 da edição de 16 de fevereiro deste jornal, que trata do projeto da marginal direita, estimulou-me a escrever o presente texto sobre o urbanismo ainda existente. Abaixo seguem alguns comentários.
Na segunda metade do século XIX havia o entendimento de que o modernismo simbolizava o influente progresso científico, cultural e tecnológico que acontecia na Europa desde a segunda revolução industrial, ao tempo da unificação dos Estados Germânicos (1864-71). Uma nova era surgia com promessas de evolução então inédita e foi neste ambiente urbano e rodoviário que a arquitetura modernista surgiu e se consolidou, inclusive doutrinariamente.
A sociedade industrial foi o símbolo dessa modernidade, deslumbrante e contemporânea daquela civilização. Os arquitetos e urbanistas seguiram o mesmo caminho e propuseram projetos que a exaltava, na expectativa de conduzi-la ao futuro, almejado pelo modernismo.
O modelo de cidade-jardim (1898), composto de várias áreas verdes distribuídas nas áreas urbanas, apresentado pelo urbanista Ebenezer Howard em oposição às cidades industriais, teve reduzida influência do rodoviarismo, mas foi considerado utópico devido à distribuição e à destinação dos espaços (a proposta era para pequenas cidades).
Posteriormente, o arquiteto Le Corbusier desenvolveu vários projetos modernistas, dos quais um deles foi o “Plano Voisin” (1925), desenhado por ele com traçados urbanos retilíneos influenciado pelo rodoviarismo, os quais cruzavam os espaços ocupados por várias áreas verdes e edifícios erguidos por “pilotis”. Nunca foi acolhido porque previa a demolição parcial do centro de Paris.
Ainda que esses modelos tenham acolhido áreas verdes na distribuição dos espaços e das tipologias urbanas e influenciado outros projetos (são exemplos os Jardins, em São Paulo e Goiânia, em Goiás), vários projetos de bairros e cidades acolheram o modelo das cidades industriais em favor das habitações, do trabalho e do rodoviarismo em conexão com referidas tipologias. As áreas verdes foram incluídas nos projetos como componentes ou ornamentos, destinadas ao lazer da população ou ao embelezamento dos logradouros públicos, com importância ecológica diminuída.
Conclusivamente, do final do século XIX até o presente muitas cidades foram projetadas para dar espaço à sociedade industrial, orientadas pelo rodoviarismo, enquanto foram incluídas com mitigada importância ecológica as áreas verdes (nativas ou não). Na presente época, se não for dada maior importância ao meio ambiente natural nos projetos urbanos ou urbanísticos, gravosos efeitos ambientais porão à prova a eficácia deles, com prejuízos aos habitantes e às cidades. Nada a mais.
Marcelo Augusto Paiva Pereira é arquiteto e urbanista.