André Tolentino
A guerra silenciosa e os desafios da civilização ocidental

O capitalismo venceu a Guerra Fria, mas o ocidente foi derrotado na “Guerra Silenciosa”
Vivemos tempos onde a política passou a ser vista como entretenimento e os políticos como celebridades.
Onde um mesmo discurso, contra a alta do dólar, por exemplo, será aplaudido ou achincalhado dependendo apenas de quem o fez, não de seu conteúdo.
Ouvimos aqui a direita brasileira gritando “imbroxável” ou a esquerda falando “todes” e lutando pelo uso de pronome neutro, da mesma forma, temos exemplos igualmente patéticos nos Estados Unidos, na França e toda Europa, tanto pelos autointitulados conservadores quanto dos ditos progressistas.
Por lá, assistimos a China, a Rússia e até a Índia (que pousou na Lua) “voando” em termos de planejamento e tecnologia, sabendo muito bem onde estão e onde querem chegar.
A queda do Muro de Berlim em 1989 e o colapso da União Soviética marcaram o triunfo do capitalismo na Guerra Fria. Naquele momento, o Ocidente parecia invencível: as democracias liberais, lideradas pelos Estados Unidos, alcançaram uma hegemonia política, econômica e cultural sem precedentes.
Contudo, passadas algumas décadas, percebemos que estamos em meio a uma nova batalha, mais sutil, que expõe as fragilidades do mundo ocidental. Esta é uma guerra silenciosa, travada não com exércitos ou armas convencionais, mas por meio de divisões internas e disputas ideológicas que minam as bases da nossa civilização.
Enquanto estamos paralisados em debates acalorados sobre questões de gênero, identidades e outros temas que, embora relevantes, não dizem respeito ao Estado, mas às próprias decisões e condições individuais, potências orientais trilham um caminho diferente. Esses países têm investido pesadamente em suas economias, em tecnologia de ponta e em planejamento estratégico de longo prazo.
A China, por exemplo, registrou um crescimento anual médio do PIB de cerca de 6,3% na última década, enquanto os Estados Unidos apresentaram um crescimento médio de 2,3% no mesmo período, segundo dados do Banco Mundial. Simultaneamente, a Índia desponta como a quinta maior economia mundial, ultrapassando o Reino Unido em 2022.
O contraste se torna ainda mais evidente quando analisamos a eficiência do planejamento governamental. A China lidera a produção global de tecnologias verdes, como painéis solares e baterias de íon-lítio, e já investiu mais de US$ 1 trilhão em projetos de infraestrutura no âmbito da iniciativa Belt and Road.
Em paralelo, governos ocidentais frequentemente se veem atônitos diante de crises internas, muitas vezes priorizando disputas morais e religiosas que, embora importantes no âmbito individual, não deveriam ser o foco central das políticas governamentais.
Na Rússia e na Índia, observa-se igualmente um foco em objetivos nacionais que transcendem questões internas divisivas. A Rússia, mesmo sob sanções internacionais, sustenta sua relevância no setor energético, sendo responsável por cerca de 17% da produção global de gás natural. A Índia, por sua vez, registrou um avanço de 15% em seu índice de produção industrial em 2023, impulsionada por reformas econômicas que visam atrair investidores estrangeiros.
O Ocidente, em contrapartida, parece ter perdido seu senso de propósito coletivo. As democracias liberais, antes vistas como bastiões da liberdade e do progresso, agora enfrentam crises de identidade e um enfraquecimento da capacidade de agir em unidade. Um estudo recente do Pew Research Center revelou que mais de 60% dos americanos acreditam que o país está mais dividido hoje do que em qualquer outro momento desde a década de 1970.
É crucial destacar que o papel dos governos é liderar em questões que impactam diretamente o bem-estar coletivo, como planejamento econômico, educação, saúde pública e desenvolvimento tecnológico. Quando essas prioridades são substituídas por disputas internas de caráter moral ou religioso, corre-se o risco de comprometer a capacidade de competir em um mundo cada vez mais multipolar.
O momento exige reflexão e ação, precisamos resgatar os valores que construíram nossas sociedades: a liberdade, a inovação e a busca pelo bem comum. É preciso um replanejamento estratégico que priorize o fortalecimento econômico, o desenvolvimento tecnológico e a coesão social, sem cair nas armadilhas de divisões estéreis.
Mais do que nunca, o Ocidente precisa de lideranças visionárias e de uma população disposta a trabalhar em prol de um futuro mais forte e unido.
Sun Tzu estava certo: a guerra mais eficiente é aquela que se vence sem precisar ser travada no campo de batalha e, se não despertarmos para essa realidade que o Oriente conhece muito bem, corremos o risco de ver o Ocidente perder sua posição de liderança global, não por causa de uma derrota militar, mas por um colapso que começa de dentro para fora.
André Tolentino é advogado.