Nelson Fonseca Neto
O estranho
Essa história de se achar ou não velho é complicada pra mim. Minha opinião a respeito oscila bastante. Tem hora que eu me acho jovem, tem hora que eu me acho velho.
Dizem que idade é um estado de espírito. Concordo em partes. Meu joelho estala bem mais agora. Não há pensamento positivo que dê conta disso.
Sou daquelas pessoas que não aparentam a idade que carregam. Tenho 47, e muita gente diz que tenho, no máximo, 40. Não me sinto lisonjeado com isso. Jamais pintarei a barba ou o cabelo. Respeito quem o faça.
Vou jogar aqui algumas palavras que têm cara e cheiro de filosofia de botequim: envelhecer é sentir-se menos confortável no tempo presente. Vocês já passaram por isso? Olhar ao redor e pensar: o que estou fazendo aqui?
Não encaro a pergunta como algo trágico. Até que dá pra se divertir com esse sentimento de inadequação. Não o tempo todo, porque ninguém é de ferro.
Quando estou num lugar lotado, gosto de observar a galera. Eu já disse aqui, e não foi uma vez só: dá pra criar boas histórias a partir dessas observações. Criar histórias ou entender melhor como o mundo vem funcionando.
Sabem quando tem alguma coisa incomodando, mas a gente não consegue descobrir exatamente o que é e, lá pelas tantas, vem o estalo: é isso! Aconteceu comigo na semana passada.
Eu estava num saguão, e muita gente circulava por lá. Tinha alguma coisa latejando na minha mente. E então veio o bendito estalo. O estalo: tem muita gente criando pra si a fachada de casca-grossa, de rude, de malfeitor.
Não estou me referindo apenas à roupa. Se fosse só isso, eu nem tentaria escrever a respeito. Não escreveria porque ia ficar uma bobagem rasa. A coisa vai muito além da roupa: é o olhar, o tom de voz, o gosto pelo palavrão, a maneira de conduzir o carro ou a motoca.
Vamos falar a verdade, meu povo? Tem muita gente que está se achando o guerreiro ou a guerreira da vida. Malditas redes sociais, que inocularam a convicção de que todos são celebridades. (O parágrafo saiu bem amargo, mas vou deixar mesmo assim, estimados leitores.)
Eu me recuso a gastar aqui muito tempo explicando o óbvio: esse lance de querer intimidar entrega a insegurança da pessoa. É um jeito comovente de passar recibo.
A casca é de guerreiro espartano, mas o miolo é de poodle. Uma pena que muita gente tenha entrado nessa barca furada de mostrar força a qualquer custo. Meu amigo, tire a armadura e vá ser feliz.
O drama é que eu vejo essas coisas e penso: eu não conseguiria conversar mais de um minuto com um cara que ostenta a fachada de valentão. Não estou exagerando.
Antes que alguém me acuse de intolerante: o problema está em mim.
Nessas horas eu sinto que o meu tempo não é o de agora. Tento combater esse sentimento. Não é bom alimentar essas ranhetices. Tenho um filho pequeno pra criar.
Vão sentindo o drama: eu estava ouvindo um podcast sobre a Copa de 98. Os caras que produziram o episódio capricharam adornando a coisa com várias músicas e reportagens de tv e rádio da época. Eu me senti em casa. Pô, quase 27 anos atrás!
Resolução para 2025: entrar na linha e caprichar na fachada. Aguardem o surgimento do bad boy de oclinhos. (Sem eles eu tropeço no primeiro desnível da calçada.)