Nildo Benedetti
Filme do Youtube sobre Democracia (parte 3 de 6)

2. Os níveis de conhecimento segundo Spinoza
Quando analisei nesta coluna o filme “Homens comuns”, citei os três níveis de conhecimento apontados pelo filósofo holandês Baruch Spinoza. Sua concepção é a de que a ética esteja relacionada ao conhecimento das relações de causa e efeito. Apenas escreverei aqui sobre os dois primeiros níveis, que nos ajudarão a conectar o totalitarismo à ignorância.
O nível de conhecimento mais baixo é o que Spinoza chama de conhecimento do primeiro gênero, opinião ou imaginação. Nesta categoria se situa o ignorante que está absolutamente seguro da sabedoria de suas crenças mais extravagantes e desordenadas e crê que seu conhecimento seja baseado na razão.
Esse nível de conhecimento é o da maioria dos indivíduos e é encontrado em todas as classes sociais e econômicas. É o das pessoas passivas, que vivem de sensações, da experiência, da imaginação arbitrária dos fatos. Como não usam a razão, têm ideias confusas e contraditórias e não conseguem compreender logicamente as relações de causa e efeito. Simplesmente repetem o que ouvem, sem qualquer crítica, são facilmente influenciáveis, acreditam em qualquer disparate desde que atendam às suas crenças, estão seguros de que na Democracia os políticos se corrompem e que os líderes totalitários são honestíssimos.
Todos começamos nossa vida por esse primeiro gênero. Podemos ou não evoluir para o segundo gênero, o do conhecimento racional. Este leva o indivíduo a estabelecer relações de causa e efeito e a agir pela razão, pelo intelecto, pela inteligência, a procurar a lógica da sua relação com o mundo. Spinoza definiu-o como o “fato de termos noções comuns e ideias adequadas das propriedades das coisas”. Esta é a forma de conhecimento necessária para a instalação de um regime democrático de governo. Por meio da razão, reconhecemos que os seres humanos não podem pensar uniformemente, porque cada um tem sua personalidade particular; reconhecemos a pluralidade das religiões, reconhecemos que homossexualidade ou bissexualidade independem da vontade própria do gay ou da lésbica e que a conversão gay é impossível; reconhecemos que o racismo não tem qualquer base científica, cristã ou linguística, como escrevemos na análise de ‘M8-quande a morte socorre a vida’ (não existe estudo científico que demonstre que a cor da pele determine a moralidade de uma pessoa). Sabemos da existência real da ameaça climática e confiamos na Ciência e nas vacinas que ela criou. Reconhecemos que o cristianismo exige perdão, compaixão, caridade e que a violência que o totalitarismo propaga é frontalmente contrária à doutrina cristã.
O totalitarismo só se sustenta enquanto for capaz de inviabilizar o espírito crítico e a ação política contraditória. Por isso, os totalitarismos se empenham tanto em controlar a Educação, a Imprensa, a Arte e a Cultura.
Menos de quatro meses depois de ascender ao poder em 1933, Hitler implementou a enorme queima de livros que continham crítica ou não atendiam aos padrões impostos pelo nazismo. Livros quebram o muro que separa a razão da ignorância, como representou o artista mexicano J. M. Blake em uma instalação.
Obs.: Esta série de artigos está incluída no projeto Cine Reflexão da Fundec.