Marcelo Augusto Paiva Pereira
Cidades do futuro
De longa data os arquitetos e urbanistas têm se debruçado em desenhar as cidades do futuro, no afã de encontrar respostas ao que não nos é contemporâneo. Desde o início do século 20 referidos desenhos foram pensados por vários arquitetos, dos quais o italiano Antônio Sant’Elia (1888 - 1916) foi o idealizador ao publicar, em 1914, o manifesto “L’Architettura Futurista”. Abaixo seguem alguns comentários.
Para o aludido arquiteto, a cidade futurista devia ser o resultado do mundo moderno, industrial, tecnológico e científico que se afirmava, um grandioso espaço tumultuante e dinâmico, enquanto a habitação, uma enorme máquina de concreto, ferro e vidro, dimensionada conforme as necessidades do projeto e erguida em nível acima das ruas. Deveríamos ser complacentes com grandiosos edifícios, estações de trens, colossais estações portuárias, galerias iluminadas, mercados cobertos, avenidas lineares, ruas imensas, grandes obras de cunho industrial e demolições oportunas.
Os edifícios futuristas deveriam ser desenhados com linhas curvas (oblíquas ou elípticas), em detrimento das retas, para retratar o dinamismo (movimento) que deveriam ter. Tais obras também deveriam ser de pouca duração (menos do que a vida humana) para acompanhar a evolução industrial e tecnológica e as transformações sociais ditadas pelo progresso.
Em 1916 Sant’Elia faleceu em combate da Primeira Guerra Mundial (1914 - 18) e a Arquitetura Futurista foi encampada pelos revolucionários bolcheviques após a revolução russa em 1917. Eles a acolheram porque se encaixava nos ideais deles, que pretendiam reconstruir as cidades diante da inovação cultural e social e do apego à ciência e tecnologia da época; substituíram, então, as pretensões burguesas pelos ideais comunistas. Os projetos acolhidos pelos soviéticos, entretanto, nunca foram realizados porque Stalin determinou a elaboração e execução de edifícios públicos imponentes e de habitações luxuosas aos membros do mais alto nível hierárquico do grupo político dele.
Atualmente as cidades do futuro devem ser pensadas em prol do meio ambiente natural, e não mais a favor do progresso industrial e tecnológico. Devem ser a elas incorporadas muitas áreas verdes, haver fomentos à expansão urbana vertical, redução de ruas e avenidas, expansão e melhoria do transporte público e de ciclovias, passeios públicos para pedestres, edifícios-garagem, construções planejadas e resistentes às intempéries da natureza e redução da emissão de poluentes, sem prejuízo da expansão horizontal do meio ambiente natural ao redor das mencionadas cidades.
Conclusivamente, desde a publicação do manifesto “L’Architettura Futurista” (1914), as cidades do futuro foram pensadas com o fim de apresentar projetos urbanos que atendessem às nossas sociedades. Mas, de lá para cá o foco mudou e, se hoje há quem pretenda desenhá-las, deverá projetá-las em benefício do meio ambiente natural, ainda que com o adensamento urbano resultante. Não somos mais os protagonistas do futuro, mas o meio ambiente natural. Nada a mais.
Marcelo Augusto Paiva Pereira é arquiteto e urbanista