Nildo Benedetti
Filmes da Netflix: ‘Namorados para sempre’
Encerrei o artigo da sexta-feira passada começando a relatar a viagem de Dean e Cindy para um hotel. Durante a viagem, Cindy entra em um mercado, encontra Bobby Ontario e flerta com ele. Após deixar o supermercado, ela esconde do marido o impacto e o encantamento do encontro e, perturbada, mente sobre a aparência de Bobby e sobre ele ter se tornado um perdedor. Mas o fato é que o encontro tem um grande impacto sobre Cindy.
Quando entram no quarto do hotel, Dean parece criança com um brinquedo novo. O moleque pouco atrai a esposa, que segue para o chuveiro. O banho não é para os dois, é para ela. Ele pergunta o que ela está fazendo e ela responde: o que você acha? Ele diz: vejo uma mulher molhada e nua. Adentra ao chuveiro e é repelido na sua tentativa de aproximação, ou seja, nem satisfazê-la sexualmente ele consegue mais. O pouco de conexão que aparece entre os dois se dá quando Dean coloca para tocar a música “You and Me”, que os leva à época em que se apaixonaram. Quando mais tarde ele simula uma queda para tentar fazer sexo no chão e ela, finalmente cede com asco, mas cede, ele diz: “Quanta rejeição você acha que eu aguento? Eu mereço um pouco de carinho. Eu sou bom para você e Frankie. Eu te amo, não mereço isso.” Tudo fica sem sintonia, a briga que se segue, mesmo a dança que acontece em seguida, que poderia recuperar o afeto na primeira relação sexual ocorrida ao som da mesma música, é truncada, sem leveza e com Cindy enrijecida e com rosto afastado do marido. Ele impõe o cigarro a ela, que aceita, mais uma vez sem querer, traga e espanta a fumaça com as próprias mãos.
O comportamento um tanto infantil que Dean demonstra no quarto de hotel já havia sido exibido em outras circunstâncias. Ele parece refletir a necessidade de aconchego materno. Chora como criança por causa do cão atropelado e é consolado como filho por Cindy, que assume papel de mãe; e ele a acusa de não ter executado bem a tarefa que ocasionou a morte do cão, a de fechar o portão, e se comporta com ela com a mesma indiferença com que a mãe o abandonou.
A estadia no hotel será catastrófica para o casal. A partir desse momento, a relação caminha rapidamente para o desmoronamento. Ela aproveita o compromisso que assume no trabalho e o abandona no hotel. Respira aliviada quando fica só em casa. Ele volta de ônibus. Vai ao trabalho dela e a ruptura é consumada. Dean, um homem normalmente pacífico, se torna um homem violento quando agride o médico do consultório em que Cindy trabalha ou quando dá na parede o soco que gostaria de dar em Cindy.
Dean abandona a pequena Frankie (sem Cindy ela não faz sentido) e a deixa aos cuidados de Cindy, tal qual sua mãe fez ao abandoná-lo aos cuidados do pai. O final do filme mantém o contraste do período do namoro, a ilusão do casamento e o momento da separação. O cabisbaixo e destruído Dean se encaminha na direção de uma grande festa, com fogos de artifício que iluminam cenas passadas felizes do casal. Parece a “Marcha para o cadafalso”, da Sinfonia Fantástica de Berlioz.
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Nas próximas semanas escreverei sobre aspectos muito significativos das relações amorosas que podem ser observados a partir de “Namorados para sempre”.
Esta série de artigos está incluída no projeto Cine Reflexão da Fundec.