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Dom Julio Endi Akamine

O Livro dos Cem anos de História da Igreja de Sorocaba

05 de Abril de 2024 às 22:10
Cruzeiro do Sul [email protected]
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Estamos celebrando o Centenário da Igreja Particular de Sorocaba. Dentre as muitas iniciativas desta comemoração, chamo a atenção para a futura publicação de uma obra (ainda sem título) sobre a História da Arquidiocese de Sorocaba.

Algumas perguntas iniciais ajudam a encontrar o fio condutor da elaboração desse livro. As mudanças ocorridas na Igreja de Sorocaba sempre foram positivas? Essas mudanças são avaliadas como deformação ou progresso? Qual é o critério para discernir entre evolução positiva e negativa?

Para que um estudo histórico seja significativo é preciso que não fique somente na classificação cronológica das formas históricas que a Igreja Particular de Sorocaba assumiu. Não se estuda a história somente para acumular informações, mas para fazer uma leitura de fé dos dados históricos. A pesquisa histórica, sem desrespeitar o seu próprio método, procura ser ao mesmo tempo reflexão teológica, pois procura interpretar os resultados de sua investigação à luz da Palavra de Deus, visto que, pela fé, constatamos que Deus age e está presente na história.

O que o leitor(a) encontrará nessa obra não é, portanto, uma leitura neutra da história da Igreja de Sorocaba. Pelo contrário, se trata de uma leitura de fé do passado dela. Isso exige, em consequência, o discernimento entre a fidelidade criadora das deformações, entre os aspectos essenciais da Igreja das suas formas contingentes, entre os elementos eclesiais imutáveis das suas manifestações históricas.

Qual é o critério que permite fazer esse discernimento? Evidentemente, o critério só pode ser um: o modelo originário da Igreja Primitiva do Novo Testamento com particular atenção aos seus elementos constitutivos que devem continuar no tempo. Esperamos que o leitor(a) possa perceber na exposição histórica que a Igreja do Novo Testamento permanece critério de discernimento das mudanças históricas da Igreja de Sorocaba.

Além de fazer recurso ao modelo da Igreja Primitiva como critério de discernimento, a futura obra parte de uma aceitação positiva da renovação promovida pelo Concílio Vaticano II. Neste sentido, o discurso do papa São João XXIII, que abriu a Sessão I do Concílio, dá uma orientação valida também para os nossos dias.

“O punctum saliens deste Concílio não é a discussão de um ou outro artigo, da doutrina fundamental da Igreja, repetindo e proclamando o ensino dos padres e dos teólogos antigos e modernos, pois este supõe-se bem presente e familiar ao nosso espírito. Para isto não haveria necessidade de um concílio. Mas (sic) da renovada, serena e tranquila adesão a todo o ensino da Igreja, na sua integridade e exatidão, como brilha nos Atos Conciliares, desde Trento até ao Vaticano I, o espírito cristão, católico e apostólico do mundo inteiro espera um progresso na penetração doutrinal e na formação das consciências, em correspondência mais perfeita com a fidelidade à doutrina autêntica; mas (sic) também esta seja estudada e exposta por meio de formas de indagação e formulação literária do pensamento moderno. Uma é a substância da antiga doutrina do depositum fidei e outra é formulação que a reveste: e é disto que se deve — com paciência se necessário — ter grande conta, medindo tudo nas formas e proporções do magistério prevalentemente pastoral... Sempre a Igreja se opôs aos erros; muitas vezes até os condenou com a maior severidade. Nos nossos dias, porém, a Esposa de Cristo prefere usar mais o remédio da misericórdia que o da severidade: julga satisfazer melhor às necessidades de hoje mostrando a validez da sua doutrina que condenando erros... A Igreja Católica, levantando por meio deste Concílio o facho da verdade religiosa, deseja mostrar-se mãe amorosa de todos, benigna, paciente, cheia de misericórdia e bondade com os filhos dela separados” (João XXIII, Discurso de abertura da Primeira Sessão do Concílio, 11.10.1962, apud: B. KLOPPENBURG, “Introdução geral aos documentos do Concílio”, Compêndio do Vaticano II. Constituições, decretos, declarações, Petrópolis, Vozes, 1968, p. 8).

Nesse aspecto, esperamos que o leitor(a) possa intuir a presença implícita dos grandes textos do Vaticano II que abordam, cada um a sua maneira, as dimensões fundamentais da Igreja: seu mistério na Lumen Gentium, a função dos bispos em Christus Dominus, a dos sacerdotes em Presbyterorum Ordinis, a dimensão missionária em Ad Gentes, o ecumenismo em Unitatis Redintegratio, a relação com o mundo contemporâneo em Gaudium et Spes, a unidade entre Escritura, Tradição e Magistério em Dei Verbum, a defesa da liberdade religiosa na declaração Dignitatis humanae e o respeito pelas religiões não cristãs em Nostra Aetate.

É preciso repetir e reforçar que a Igreja Particular de Sorocaba, nestes cem anos de história, teve como rumo orientador de seu desenvolvimento a Igreja do Novo Testamento e, como modo fiel de aplicação aos tempos atuais, o Concílio Vaticano II. A essas duas referências, a Igreja Particular de Sorocaba se manterá fiel.

Dom Julio Endi Akamine é arcebispo metropolitano da Arquidiocese de Sorocaba