Nildo Benedetti
Filmes da Netflix: ‘Pray away’ (Parte 4 de 4)
Encerrei o artigo da semana passada relatando a interpretação de William Barclay sobre Mateus 6:22-23. Diz Barclay que o preconceito cega-nos ante os fatos e destrói nossa capacidade de julgamento. A visão negativa da identidade sexual dos gays é movida pela cegueira do preconceito irracional, uma vez que não há absolutamente nada que justifique aquela visão, como vimos nos três artigos anteriores.
Um cristão pode desconhecer o fato científico de que o gay não tem como mudar sua sexualidade. Pode ter sido doutrinado para pensar que o gay tem controle sobre sua sexualidade e, portanto, é um pecador que opta conscientemente pela perversão. Ainda assim, deveria obrigatoriamente empregar os ensinamentos de Cristo e acolhê-lo com caridade. Santo Agostinho escreveu que “Se alguém julga ter entendido as Escrituras divinas ou partes delas, mas se com esse entendimento não edifica a dupla caridade a de Deus e a do próximo -, é preciso reconhecer que nada entendeu”.
Mateus, em 25:31-46, escreve: “Vinde, benditos de meu Pai, possuí por herança o reino que vos está preparado desde a fundação do mundo; Porque tive fome, e destes-me de comer; tive sede, e destes-me de beber; era estrangeiro, e hospedastes-me; Estava nu, e vestistes-me; adoeci, e visitastes-me; estive na prisão, e foste me ver”. Afirma Barclay que essa parábola nos ensina que Deus nos julgará de acordo a nossa resposta à necessidade humana. E que essa ajuda deve ser de coisas simples. As coisas que escolhe Jesus -- dar de comer a alguém que tem fome, dar de beber a quem tem sede, acolher a um estranho, assistir a um doente, visitar um detento -- são coisas que qualquer pessoa pode fazer. Nunca houve outra parábola que abrisse tanto o caminho para a glória às pessoas mais simples.
Essas interpretações de Barclay estão em concordância com a essência dos ensinamentos de Cristo de amor ao próximo, independentemente de etnia, sexualidade condição social etc. Os que no filme tentam se converter em heterossexuais, sofrem. E tal sofrimento é agravado quando um sacerdote, que poderia lhes dar alguma palavra de conforto, profere discursos ameaçadores de inferno e apocalipse que enchem o fiel de culpa.
O chavão “direitos humanos para humanos direitos”, amplamente difundido nos últimos anos por alguns que se dizem cristãos, contraria a passagem de Mateus 9:13: “As pessoas que têm saúde não precisam de médico, mas só as que estão doentes. (...) Porque eu não vim para chamar justos, e sim pecadores.” Portanto, escreve Barclay, a barreira que separa o santo do pecador é derrubada e o amor de Deus é dirigido a todos os seres humanos, incluindo os que, com seus pecados, nos deixam horrorizados. Mesmo que o cristão, por ignorância, considerar que o gay é um depravado, ainda assim deveria amá-lo e protegê-lo.
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Concluindo: não existem razões biológicas, psicológicas ou cristãs para a perseguição ou repúdio a indivíduos por sua identidade sexual.
Repito que não sigo qualquer religião, mas aprecio os ensinamentos dos Evangelhos. Respeito os sacerdotes que, com base nos ensinamentos de Cristo, propagam o amor ao próximo, a compaixão, o perdão e oferecem o conforto espiritual tão necessário ao ser humano diante das adversidades da vida.
Esta série de artigos está incluída no projeto Cine Reflexão da Fundec