João Alvarenga
AVC NO HD
Por que quebrou? Probabilidades: excesso de uso, descarga elétrica, solavancos. Há várias hipóteses. No caso das máquinas, a resposta é racional: obsolescência programada!
Estimado leitor, talvez, você já tenha vivenciado a seguinte situação de pânico: numa bela manhã de domingo, acorda mais cedo do que costume, para concluir um relatório importantíssimo que deve chegar à direção, sem falta, na segunda-feira. No entanto, quando tenta ligar seu computador, seu amiguinho de árduas horas de trabalho, não dá qualquer sinal de vida. Como que, por encanto, do nada, a máquina simplesmente parou de funcionar. Como assim? Meu Deus, por quê? Parece que não há respostas para algo que acontece, exatamente, quando nada pode dar errado.
Desesperado, você tenta várias manobras, na tentativa de reanimar o combalido guerreiro do seu improvisado home-office que, desde 2020, passou a ser a extensão do seu trabalho, num tímido cantinho da sala. Afinal, trabalhar em casa, por conta da pandemia, tornou-se mais do que uma necessidade, uma condição de sobrevivência.
Mas, voltando ao computador quebrado, você não se dá por vencido e parte para outras táticas: desliga, religa, várias vezes... Até dá uns trancos no bicho. E nada! Aí, bate aquela ansiedade, porque o relatório foi pra outra dimensão cósmica. Então, pensa: “O que vou dizer à chefia?” A verdade é o melhor remédio, mesmo que pareça um patético “sincericídio”.
E, quando dizemos a verdade: “não fiz porque a máquina pifou”, poucos acreditam. Afinal, todo mundo dá a mesma desculpas para escapar das broncas por não cumprir o combinado. No mínimo, vão pensar: “Não fez porque foi pra praia e se esqueceu da vida”. Ironicamente, quando mentimos, parece que temos mais crédito!
Além disso, quando algo quebra, perguntamos: por que quebrou? Probabilidades: excesso de uso, descarga elétrica, solavancos. Há várias hipóteses. No caso das máquinas, a resposta é racional: obsolescência programada! Palavrinha ingrata, porque quando a coisa deixar de funcionar, ela pifa e pronto! E sempre na hora que mais precisamos dela. Assim como a vida humana, até os computadores têm tempo de vida útil programado. Aliás, tudo, hoje! Das lâmpadas às geladeiras. É uma forma perversa de garantir o lucro das indústrias.
Sobre a pane no seu computador, o diagnóstico foi cruel: “O HD teve um AVC”. Brincadeiras à parte, nesses casos, geralmente, mais de quatro mil arquivos viraram poeira. A angústia é inevitável, pois uma vida inteira se perdeu em bites. Vida não, mas parte do cérebro, sim! Exageros à parte, tal drama se justificativa.
Afinal, se para você, o carro é a extensão do corpo humano, neste século, os computadores mantêm a memória ativa. Mas, se entram parafuso, adeus lembranças. Porém, para seu alívio, o técnico aponta uma saída: “um backup pode ser solução; mas, não salvará todos os dados, porque o estrago foi grande”. Assim, você apela aos guardiões das máquinas que poupem a placa mãe do pior. Então, depois de três dias na UTI, o coitadinho, ainda meio abalado pelo trauma, recebe alta.
No entanto, o previsto se confirmou. Não foi possível abrir todos os arquivos. Aliás, muitos deles estavam desconfigurados, já que o AVC atingiu o ‘crânio’ por inteiro. Com isso, os documentos mais recentes se perderam. Logo, numa comparação com o cérebro humano, é como se um derrame tivesse afetado parte do cérebro e o corpo não obedecesse ao sistema nervoso central. Já, no caso do computador, embora funcione, precariamente, não dará conta de todas as tarefas e, logo ficará encostado sem direito à aposentadoria.
Comparando a situação da máquina com a maioria do povo brasileiro, é possível, dizer que muita gente trabalha duro, sem ter direito a uma aposentadoria digna. E, quando adoece, às vezes, por razões profissionais, e não consegue mais cumprir com suas tarefas, é substituído por alguém mais novo. Ou, pior, por uma máquina, como acontece atualmente. Ainda bem que as máquinas, quando ficam doentes, precisam da mão de obra humana. Pelo menos os “médicos dos bites” têm emprego garantido. Bom domingo!
João Alvarenga é professor de Redação