Dom Julio Endi Akamine
Economia e ética
O fim da economia não está na economia mesma, mas na sua destinação humana e social
Os escândalos de corrupção nos negócios econômicos e na vida política têm provocado nos cidadãos uma sadia indignação. A indignação, porém, permanecerá mero sentimento manipulável se não vier acompanhado de reflexão.
O lucro é moralmente lícito? É possível ser ético na atividade econômica? Para procurar responder a essas perguntas, é oportuno conhecer o ensino social da Igreja.
O Ensino Social da Igreja reconhece a justa função do lucro, como primeiro indicador do bom andamento de um empreendimento. Quando uma empresa dá lucro, isso significa que os fatores produtivos foram adequadamente usados e as correlativas necessidades humanas devidamente satisfeitas.
O desenvolvimento, porém, não pode ser reduzido a mero processo de acumulação de bens e serviços. Ao contrário, a pura acumulação, ainda que em vista do bem comum, não é uma condição suficiente para realização da autêntica felicidade humana. Por isso, o lucro por si só nem sempre indica que a empresa está servindo adequadamente à sociedade. É possível, por exemplo, que a contabilidade esteja em ordem e simultaneamente as pessoas, que constituem o patrimônio mais precioso da empresa, sejam humilhadas e ofendidas na sua dignidade. É o que acontece quando a empresa está inserida em sistemas socioculturais caracterizados pela exploração das pessoas, tendentes a fugir das obrigações de justiça social e a violar os direitos dos trabalhadores.
É indispensável que, no interior da empresa, a legítima busca do lucro se harmonize com a irrenunciável tutela da dignidade das pessoas que atuam na mesma empresa. As duas exigências não estão absolutamente em contraste uma com a outra. Não seria realista pensar em garantir o futuro da empresa sem a produção de bens e serviços e sem conseguir lucros que sejam fruto da atividade econômica realizada. Por outro lado, o ser humano é o autor, o centro e o fim de toda a vida econômico-social. Por isso o lucro é legítimo na medida em que se respeitem os princípios éticos.
Ainda que a economia e a moral “se regulem, cada uma no seu âmbito, por princípios próprios”, é um erro julgar a ordem econômica e a moral tão afastadas e alheias entre si, que de modo nenhum aquela dependa desta. A relação entre moral e economia é necessária e intrínseca: elas se compenetram intimamente. A distinção entre moral e economia não implica uma separação entre os dois âmbitos, mas, ao contrário, uma importante reciprocidade.
Como no âmbito moral se devem ter em conta as razões e as exigências da economia, assim é imperioso abrir-se às instâncias morais quando se atua no campo econômico. Dar o justo e devido peso às razões próprias da economia não significa rejeitar como irracional qualquer consideração de ordem metaeconômica, precisamente porque o fim da economia não está na economia mesma, mas na sua destinação humana e social.
A dimensão moral da economia faz tomar como finalidades indivisíveis, nunca separadas e alternativas, a eficiência econômica e a promoção de um desenvolvimento solidário da humanidade.
Junto com uma necessária eficiência na produção de bens é preciso buscar também uma eficiência social da economia. Se de um lado é um dever desempenhar de modo eficiente a atividade de produção dos bens, pois do contrário se desperdiçam recursos; de outro, não é aceitável um crescimento econômico obtido em detrimento dos seres humanos, de povos inteiros e de grupos sociais, condenados à indigência e à exclusão.
Outro fator que aproxima economia e moral, eficiência de produção e eficiência social é a salvaguarda do protagonismo do ser humano no desenvolvimento da economia. Para que a atividade econômica tenha a categoria de atividade moral, ela deve ter como sujeito pessoas e povos. Todos têm o direito de participar da vida econômica e o dever de contribuir, segundo as próprias capacidades, com o progresso do próprio país e de toda a família humana. Assim a atividade econômica se torna um espaço vital de exercício desse protagonismo do ser humano no seu próprio desenvolvimento.
Vivida moralmente, a economia é, portanto, prestação de um serviço recíproco, mediante a produção dos bens e serviços úteis ao crescimento das pessoas, e se torna oportunidade para a pessoa poder viver a solidariedade e a vocação à comunhão com os outros seres humanos para a qual Deus o criou.
Dom Julio Endi Akamine é arcebispo metropolitano da Arquidiocese de Sorocaba