João Alvarenga
O mercadão resiste
De forma lúdica, poderíamos dizer que o mercadão está magoado porque foi relegado ao segundo plano
O que acontece como o nosso Mercado Municipal? Por que há uma sensação de abandono no ar? Quem percorre os corredores daquela imponente construção de 1938, em estilo Arte Déco, nota que há muitos boxes vazios. Assim, nos estabelecimentos em que, antes funcionava um comércio ativo, restam apenas alguns panos que tentam impedir a visão do óbvio. A situação evidencia que algo não está bem. Ou será só um delírio deste cronista? A verdade é que, nas unidades fechadas, não há nenhum aviso dando conta do ocorrido. Tem-se apenas um boxe desativado. E nada mais!
Nesse contexto, os frequentadores assíduos daquele local já perceberam que os açougues, que antes reinavam absolutos, estão quase todos fechados. Aos poucos, várias opções de mercadorias, desaparecerem da paisagem. Lamentavelmente, até mesmo algumas lanchonetes, com o tradicional “pingadinho” estão sendo desativadas. Por que esse fenômeno está ocorrendo? Será que isso é algo exclusivo da nossa cidade?
Especialistas em urbanização atestam que tal processo se acentuou, em muitas cidades brasileiras, a partir da degradação dos centros históricos, ou seja, o chamado “coração” das cidades. Tanto que, no caso de nossa cidade, até as praças centrais precisam passar por uma ampla revitalização. Mais do que isso, diminuir a sensação de insegurança que o cidadão tem, quando transita pela praça Coronel Fernando Prestes, ou adjacências, em certos horários.
Por hora, ao mesmo tempo em que os boxes do velho mercadão vão sendo desativados, há um silêncio dos que resistem com seus pequenos comércios e extraem, com dignidade, o sustento da família. No fundo, são verdadeiros heróis anônimos que merecem nosso aplauso, pois mais do que manter a vida comercial ativa naquela região, também mantêm viva a nossa história, pois o Mercado Municipal faz parte de um passado encantador. Por isso, sua construção deve ser preservada e o comércio reaquecido.
Quanto ao fechamento dos comércios, parece que o setor público ainda não se manifestou sobre essa problemática questão. Entre os comerciantes ativos não faltam especulações. A mais plausível é a de que os antigos proprietários faleceram e os herdeiros desistiram de seguir com o negócio. Também acreditam que a falência se deu por dificuldades financeiras ou, quem sabe, obstáculos para manter os impostos em dia, algo muito custoso, além de burocrático.
No fundo, os mais antigos sentem tristeza ao ver que, dia a dia, aquele local se torna desinteressante às novas gerações, mais afoitas ao glamour de sofisticados centros de compra, os chamados shoppings, modismo norte-americano que se consolidou com grande força nas grandes cidades, porque concentra, num só lugar, lazer e consumo.
No fundo, pode ser só impressão de quem passa, mas o ambiente parece meio entristecido. De forma lúdica, poderíamos dizer que o mercadão está magoado porque foi relegado ao segundo plano. A frase do comerciante Alberto Isaac: “Envelheço com a loja”, sustenta esse sentimento. Afinal, evidencia a relação afetiva que o comerciante mantém com seu comércio, como se o estabelecimento fosse um ente querido. Detalhe: por décadas, Isaac manteve um bazar de roubas no Mercado Municipal de Itapetininga. Parece que os mercadões, tanto o de lá quanto o de cá, enfrentam problemas semelhantes.
Portanto, vale lembrar que, se as cidades brasileiras cresceram às margens dos grandes rios, com certeza, o progresso se efetivou a partir de seus antigos mercadões. Sorocaba não foge à regra, tanto no que diz respeito ao rio que dá nome à cidade quanto ao mercadão. Lá, não só vendia-se de tudo, como também funcionava como um atrativo a mais para quem vinha da zona rural para fazer compras no Centro. Assim, circular, hoje, pelos seus corredores é revisitar o passado. Apesar dos percalços, o mercadão resiste à modernidade. Bom domingo!
João Alvarenga é professor de redação