Vanderlei Testa
O caldinho de mandioca ou de feijão na cultura sorocabana
Rico em vitaminas e complexo B, fibras e potássio, o caldinho de feijão é um sinônimo de energia à base de ferro. Em Sorocaba, durante muito tempo foi também um caldinho cultural. Nos anos 2010, em momentos dos encontros festivos da diretoria da Associação Sorocabana de Imprensa (ASI), havia a presença do saudoso presidente da entidade, o publicitário e jornalista Manoel Mota e da sua esposa, jornalista Marta Mota. Eles preparavam o caldinho de feijão das receitas que trouxeram de Caruaru, cidade natal do Manoel, no Estado de Pernambuco. Na receita, feijão carioquinha, bacon picado, calabresa picada, carne de charque dessalgada, colorau, alho, cebola, pimentão picado, tomates picados, batatas inglesas, pimenta de cheiro, cheiro verde, coentro verde picado, ervilha, azeite, molho inglês e molho de pimenta. Sal a gosto. A receita completa do “Caldinho do Manoel Mota” está no www.blogvanderleitesta.com
Entre as usuárias da Biblioteca Infantil Municipal, localizada na rua da Penha, em Sorocaba, a professora de artes Maria Antônia Seabra Almeida Costa é uma das mais lembradas. Ela é criadora do caldinho de mandioca paulista, servido nessa casa cultural. Maria Antônia cozinhava para brindar as pessoas que frequentavam as festas de Santo Antônio. Sua habilidade culinária e dom carismático de acolhimento proporcionavam palavras positivas às pessoas. Ela sabia dar o tempero no caldinho. Desde os seus tempos de professora de artes plásticas, no Instituto de Educação Júlio Prestes de Albuquerque -- Estadão --, Maria Antônia já promovia ações culturais com os alunos. Em 2016, ela promoveu a Feira Cultural do Estadão, reunindo os estudantes em manifestações repletas de criatividade, que incluíam avatares e personagens, como Johnny Depp.
O caldinho de mandioca paulista é uma marca da receita de generosidade da Maria Antônia. Arrojada educadora, é uma sorocabana que dedicou a sua vida ao ensino até a sua aposentadoria. As suas palavras são como um alimento repleto de vitaminas à paz interior das pessoas. Como o plantador das sementes do feijão e da raiz da mandioca, que ara a sua terra e a rega com a água para fazer germinar e crescer à colheita, a Maria Antônia planta amizades pelo simples fato de tornar o mundo mais humano e feliz. Sem nunca se esquecer dos alunos do “Estadão”, ela é uma inovadora em cultura e entusiasmada em manter as tradições da educação na cidade. Foi uma das responsáveis pelo projeto que culminou no grande encontro de alunos (primeiras turmas da escola), na comemoração “Estadão 90 Anos”, que aconteceu no salão nobre da escola em 2019. Só faltou o caldinho de mandioca, mas teve um “caldão” de emoções e lembranças entre professores e alunos.
Adolfo Frioli, Gilberto Fernando Tenor e os historiadores que frequentavam a sala do José Rubens Incao ,na Biblioteca Infantil de Sorocaba, relembram a presença anônima da professora que evitava, na sua simplicidade, ser elogiada por seus méritos. Ninguém sabia quem era a cozinheira do caldinho de mandioca que pilotava o fogão à lenha da biblioteca, mas a Maria Antônia estava lá, fazendo a sua receita. “O importante era a confraternização e sabor que dava aos participantes das festas do santo padroeiro Antônio”, me contou a sua amiga e também professora Luciá Piacitelli Tomé.
O caldinho de mandioca na cultura popular é considerado um alimento que fortalece a imunidade. Pelas suas características nutricionais, a mandioca, aipim ou macaxeira, é uma fonte de vitamina A e de antioxidantes naturais poderosos, segundo os especialistas em gastronomia. O caldinho de mandioca paulista é excelente e altamente eficaz no fortalecimento humano. Na Amazônia, o costume é chamar a mandioca de tucupi. É muito usado na culinária do Norte do Brasil. O caldinho por lá é feito de mandioca brava, extraída através do tipiti (instrumento usado pelas populações indígenas).
As filhas Luciá e Leni, de Áurea Lopes Piacitelli, autora do livro “Sumiko”, lançado na Fundec em 3 de fevereiro, destacaram a arte da Maria Antônia. Ela realizou toda a decoração do salão com a sua habilidade, produzindo uma cortina de tsurus (símbolo da paz no Japão). Cada convidado da noite de autógrafos recebeu uma peça de tsurus com mensagem da família da escritora e os desejos de paz, saúde, felicidade e alegria. Essa é uma das características de voluntariado que Maria Antônia sempre busca proporcionar com a sua arte ou caldinho. Ela faz isso em gratidão aos que cruzam o seu caminho, como um elo de uma corrente do bem da qual pessoas como a Maria Catarina Milanez fazem parte.
Vanderlei Testa ([email protected]), jornalista e publicitário, escreve às terças-feiras no jornal Cruzeiro do Sul