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João Alvarenga

O fio da consciência

A campanha "Janeiro Branco" cumpre um papel fundamental, uma vez que lança luz à falta de conhecimento sobre um problema que pode afetar qualquer um dos nossos familiares

28 de Janeiro de 2023 às 22:01
Cruzeiro do Sul [email protected]
João Alvarenga
João Alvarenga (Crédito: Arquivo pessoal)

“Há um fio tênue que separada a lucidez da loucura”. A frase é do dramaturgo francês, Antonin Artaud, escrita no começo do século passado, numa das muitas cartas-súplicas dirigidas aos psiquiatras franceses.

Diagnosticado como louco, Artaud era crítico ferrenho dos métodos de tratamento das pessoas com doenças mentais. Naquela época, não existiam terapias alternativas ou medicamentos. Muito menos diálogo.

Pelo que se sabe, a psiquiatria clássica acreditava que o eletrochoque poderia curar os pacientes. Não só não curava como piorava o estado mental dos doentes. Mas, antes mesmo de Artaud, Machado de Assis, no livro “O alienista”, no final século 19, já ironizava a forma com a medicina antiga via as questões mentais, porque para a sociedade da época os “loucos eram todos iguais” e, por representarem uma ameaça, deveriam ser alienados (apartados) do convívio social. Essa visão distorcida separou muitos familiares e segregou pessoas que precisavam muito mais de amparo do que de clausura.

De lá para cá, muita coisa mudou em termos de saúde mental, mas a mente humana continua um enigma a ser desvendado pelos especialistas. Ainda mais nos dias de hoje, cuja complexidade da vida pós-moderna tem contribuído muito para o adoecimento até mesmo de crianças e adolescentes. Tanto que o Brasil é o 5º país em casos de depressão, situação agravada pela pandemia do Covid-19.

Todavia, os termos “ansiedade”, “síndrome do pânico” e “complexo bipolar” ainda são pouco compreendidos pela maioria da população, pois desconhece seus reais sintomas. Nesse contexto, especialistas em saúde mental chamam a atenção das famílias para certos comportamentos, como: isolamento, tristeza e apatia. Tais idiossincrasias, no passado, eram ignoradas pela falta de estudo e, agora, pedem mais cuidados dos familiares.

Por isso a campanha “Janeiro Branco” cumpre um papel fundamental, uma vez que lança luz à falta de conhecimento sobre um problema que pode afetar qualquer um dos nossos familiares. Nós mesmos estamos suscetíveis a adoecer mentalmente. Embora a campanha foque sua ação no início do ano, a atenção deve continuar ao longo de 2023 e, ao menor sinal de alerta, procurar ajuda.

Porém, como perceber que um ente querido está passando por uma crise de ansiedade? Parece que não há uma resposta clara, pois é difícil saber o que se passa na mente de uma pessoa que está com dificuldades até mesmo de externar o que sente. Ainda que seja uma pessoa tão próxima, a conversa -- às vezes -- é truncada, porque o doente tem medo de se expor, não ser compreendido ou taxado de louco. Para os leigos, tudo não passa de “frescura”.

Nesse contexto, o mundo das artes tem mostrado de forma intensa as dores que atingem as vítimas de transtornos mentais, algo que nos leva a crer que os artistas são mais suscetíveis à perda de consciência. Ledo engano, o fato é que atores, escritores, pintores e músicos têm coragem de expor o que sentem, até como uma forma de “exorcizar os demônios” para que a dor passe.

Por isso, hoje, a arte é uma grande aliada na recuperação dos pacientes. Como exemplo de como a expressão artística alivia as tensões, temos a figura do pintor holandês Van Gogh. Vítima de uma possível combinação de distúrbios, o artista, durante suas crises, produziu obras geniais que hoje valem milhões de dólares.

Embora a depressão seja o “mal do século 21”, essa doença é mais antiga do que se imagina. Fernando Pessoa, Franz Kafka e Edgar Allan Poe foram suas vítimas mais famosas. Também fazem parte da lista: Philip K. Dick, Sidney Sheldon, Virgínia Woolf, Liev Tolstoy, Sílvia Plath e Clarice Lispector, entre outros.

Por fim, até o padre Marcelo Rossi sentiu os efeitos nocivos desse mal. Então, fica a dúvida: como manter a saúde mental? Focar bem as tarefas, não sobrecarregar o cérebro e evitar o estresse. Uma boa noite de sono também ajuda. Bom domingo!

João Alvarenga é professor de redação