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Crônicas Sorocabanas

Sobrou pra Van Gogh

A obra, estimada em 74 milhões de dólares, fora pintada em 1888, sendo um dos marcos desse genial e incompreendido artista

28 de Outubro de 2022 às 00:01
Cruzeiro do Sul [email protected]
Van Gogh
Van Gogh (Crédito: Reprodução)

É notório que a internet empoderou os movimentos sociais que, a partir de um intenso ativismo digital, incluíram várias pautas reivindicatórias. As causas ambientais ganham maior visibilidade. Mas, até que ponto esse ciberativismo tem legitimidade? Ou seja, será que todas as ações são válidas? Afinal, há grupos que extrapolam os limites da simples reivindicação e, em alguns casos, geram transtornos à sociedade. Assim, os exageros mais atrapalham do que ajudam.

Nesse contexto, pode-se tomar como exemplo o descabido ataque que duas ativistas londrinas perpetraram, recentemente, contra a tela “Os girassóis”, do pintor expressionista holandês, Vincent van Gogh. A obra, estimada em 74 milhões de dólares, fora pintada em 1888, sendo um dos marcos desse genial e incompreendido artista. Segundo, os noticiários, a revoltadas meninas mancharam a pintura com sopa de tomate. O dano só não foi maior porque um vidro protegia a pintura. Mas, a moldura sofreu avarias.

Seria cômico se não fosse trágico, uma vez que o tal protesto não era contra a cultura necrófila reinante no mundo das artes, ou seja, os artistas autênticos só são valorizados depois que morrem. Com isso, suas produções passam a valor milhões, mas a família do morto não tem direito a um centavo. Se essa fosse a ideia, quiçá tivesse certa legitimidade. Só que não! A desastrosa ação visava protestar contra o uso de combustíveis fósseis, a fim de conter as agressões ao meio ambiente.

De certo modo, a causa parecia nobre, mas a ação foi pobre, pois mirou no alvo errado, já que o pintor em questão nunca fora magnata da indústria petrolífera. Longe disso, esse perturbado gênio viveu e morreu na mais absoluta miséria. Pelo que se sabe, em vida, vendeu um único quadro, cujo comprador foi seu próprio irmão, Theo que, no fundo, era quem o sustentava. Segundo o livro “Cartas a meu irmão Theo”, Van Gogh jamais sentiu o gostinho da fama. Várias obras evidenciam isso. Por isso, o referido ataque surtiu efeito contrário, já que feriu uma vítima do sistema, não quem o mantém.

João Alvarenga é professor de redação