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Alexandre Garcia

O voto e o crime

Se foi atentado planejado -- e já estavam prevenidos para isso, ante indícios -- ou bloqueio para não entrar, não importa; acaso é que não foi

20 de Outubro de 2022 às 00:01
(Crédito: ARQUIVO AGÊNCIA BRASIL)

Desde a antiga Grécia -- se atribui a Ésquilo -- diz-se que na guerra, a primeira vítima é a verdade. Pois é o que estamos vendo, cada vez mais, à medida em que se aproxima o dia decisivo, na guerra eleitoral. A verdade é vitimada todos os dias. No debate na Band, foi uma enxurrada de mentiras. A mitomania está em seu ponto alto. Pior que a mentira deslavada, que todos percebem, é a mentira disfarçada de informação, camuflada como se fato fosse. César Maia criou o verbete factóide: tem forma de fato, mas não é fato; é o fato deformado, adulterado, para enganar quem simplesmente o engole passivamente, sem verificar se está engolindo informação envenenada.

O TSE fez campanhas contra isso mas, como estamos vendo, não tiveram efeito desejado. Já participei de 24 eleições e vi muitas outras, desde 1945 -- a primeira depois da ditadura. Mas nunca encontrei tanto baixo nível como agora. Portanto, as campanhas da Justiça Eleitoral não deram resultado, anuladas pela alta temperatura emocional da campanha. Além disso, o TSE vem sendo mobilizado pelos partidos todos os dias, não apenas contra calúnias, injúrias e difamações, mas contra fatos do passado e do presente. E a Justiça apressada acaba fazendo censura, o que é proibido pela Constituição, no art. 220. Por exemplo, na informação jornalística dos cumprimentos do ditador Ortega a Lula, que é notícia e não fakenews; ou o caso de um documentário da Brasil Paralelo.

Agora o baixo nível desceu mais, com os tiros contra o veículo do candidato Tarcísio em Paraisópolis, São Paulo. Se foi atentado planejado -- e já estavam prevenidos para isso, ante indícios -- ou bloqueio para não entrar, não importa; acaso é que não foi. Não foi o caso de um tiroteio em que o candidato decidiu intrometer-se entre dois fogos. O fato é que se o veículo não fosse blindado, Tarcísio poderia estar ferido ou morto. O episódio faz lembrar do 6 de setembro de 2018, quando Adélio Bispo enfiou uma faca na barriga do candidato Bolsonaro, que só sobreviveu porque foi atendido imediatamente por cirurgiões competentes da Santa Casa.

O triste é que o fato de Paraisópolis, que impediu a entrada do candidato ao governo de São Paulo se junta ao do complexo do Alemão, visitado pelo candidato à presidência, Lula, dias antes. Revela a existência de territórios dominados pelo crime, em que a lei brasileira não entra. O Ministro Fachin e o Supremo contribuíram para agravar isso, ao impedir a entrada da polícia em tempos de pandemia. São santuários do crime, territórios “liberados”, em que o poder criminoso permite a entrada de um candidato e bloqueia a entrada de outro. Quer dizer, é o crime participando ativamente da campanha eleitoral. Isso levanta uma terrível pergunta: tem a Justiça Eleitoral o poder de garantir voto livre aos eleitores que moram nessas comunidades dominadas pelo crime? Ou lhes será imposto o candidato que interessa às organizações criminosas.

Alexandre Garcia é jornalista