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Eduardo Pragmácio Filho

Dia de Eleição é feriado nacional

O exercício do voto é um direito fundamental de todo cidadão, que, por sua vez, tem o dever e obrigatoriedade de votar

30 de Setembro de 2022 às 00:01
Cruzeiro do Sul [email protected]
Eduardo Pragmácio Filho
Eduardo Pragmácio Filho (Crédito: Divulgação)

Com a proximidade do pleito eleitoral, muitos empresários do comércio em geral têm dúvidas sobre a possibilidade de abrir seu negócio no dia do pleito, em virtude de a data ser configurada como feriado ou não.

A legislação trabalhista proíbe, como regra geral, o trabalho em dia de feriados, pois “todo empregado tem direito ao repouso semanal remunerado de 24 horas consecutivas, preferentemente aos domingos e, nos limites das exigências técnicas das empresas, nos feriados civis e religiosos, de acordo com a tradição local”, conforme prescreve o art. 1º da Lei 605/49.

As exceções a essa regra, com autorização permanente para o trabalho em feriados, estão estabelecidas a partir do artigo 151 do Decreto 10.854/21 e nas atividades constantes do anexo IV da Portaria/MTP 671/21.

São feriados, para fins trabalhistas, de acordo com a Lei 9.093/95, (i) os declarados em lei federal, (ii) a data magna do Estado e (iii) quatro feriados religiosos decretados por lei municipal, neles incluída a Sexta-feira Santa (feriado com data móvel, pois depende do calendário litúrgico cristão).

Há vários feriados nacionais, declarados em lei federal, como o 12 de outubro (Lei 6.802/80), o 1º de janeiro e o 7 de setembro (Lei 662/49), e o dia das eleições gerais (art. 380 do Código Eleitoral - Lei 4.737/65).

Especificamente sobre o dia das eleições gerais, o art. 380 do Código Eleitoral é claro ao prescrever que “será feriado nacional o dia em que se realizarem eleições de data fixada pela Constituição Federal; nos demais casos, serão as eleições marcadas para um domingo ou dia já considerado feriado por lei anterior”.

As eleições gerais têm, segundo a Constituição Federal de 1988 (art. 77), uma data fixada no primeiro domingo do mês de outubro do último ano do mandato. Trata-se, portanto, de feriado de data móvel, mas sempre em um domingo, aos moldes daquele da Sexta-feira Santa (data móvel mas sempre às sextas).

A ideia por trás da decretação do feriado em dia de eleição é facilitar o direito-dever de votar de todo cidadão, proporcionando sua ida à sessão eleitoral.

Importante lembrar que é permitido o trabalho em feriados nas atividades do comércio em geral, desde que autorizado em convenção coletiva de trabalho e observada a legislação municipal, conforme preceitua o art. 6º-A da Lei 10.101/00, tema já pacificado no Supremo Tribunal Federal (Súmula Vinculante 38 e Súmulas 419 e 645 do STF).

Em outras palavras, somente se pode abrir o comércio em geral e exigir o trabalho de empregados no dia de eleição (pois se trata de feriado) quando observadas as condições nas convenções coletivas de trabalho vigentes (note-se que não é possível a autorização via acordo coletivo) e nas leis municipais da localidade.

O Tribunal Superior Eleitoral vem entendendo que o art. 380 do Código Eleitoral permanece em vigor (ver o acórdão da Consulta 0600366-20.2019.6.00.0000, relator ministro Jorge Mussi, de 29/08/2019), pois, inexistindo norma em sentido contrário, o dia das eleições é feriado nacional.

Neste último julgado do TSE, ficou consignado que “a partir da evolução jurisprudencial da temática nesta Corte Superior, conclui-se que os dias de escrutínio são feriado -- aplicável referida regra, quanto ao segundo turno, somente às localidades em que este ocorrer --, mas é possível que o comércio funcione nessas datas, desde que se observem as normas de convenções coletivas de trabalho, as leis trabalhistas e as respectivas posturas municipais, bem como não se cause embaraço ao exercício do sufrágio dos funcionários, sob pena de se ter configurado o crime do art. 297 do Código Eleitoral”.

O Tribunal Superior do Trabalho (TST), por outro lado, em alguns julgados turmários, vem entendendo que a Lei 10.607/02 suprimiu o dia em que forem realizadas eleições em todo o País como feriado nacional e, em razão disso, não haveria incidência de pagamento em dobro nem obrigatoriedade de não exigir o trabalho no dia do pleito.

Em que pese a posição do TST, com as devidas vênias, entendo que feriado civil, para fins trabalhistas, é aquele declarado em lei federal (e o Código Eleitoral é uma lei federal). A intenção do legislador, desde o advento do Código Eleitoral e da obrigatoriedade de votar, é facilitar o acesso do eleitor às urnas. Portanto, a exigência de comparecer ao trabalho, salvo as exceções já previstas em lei, seria incompatível com esse direito-dever do cidadão.

Ressalte-se que somente no final dos anos 1990 e início dos anos 2000 é que o comércio em geral teve a abertura aos domingos autorizada e a possibilidade de trabalho em feriados, culminando na Lei 10.101/00.

Ao se fazer uma interpretação sistemática e teleológica, portanto, é possível concluir que: (i) o dia das eleições é feriado civil, declarado em lei federal (art. 380 do Código Eleitoral); (ii) o trabalho do comércio em geral, em dia de feriado, só pode ocorrer se atendidas as condições estabelecidas em convenções coletivas e de eventual lei municipal, de acordo com o art. 6º-A da Lei 10.101/00; (iii) o TSE permite a abertura do comércio no dia das eleições, desde que atendidas as condições em normas coletivas e lei municipais; (iv) a exigência de trabalho no comércio em geral, no dia do pleito, fora das hipóteses legais e do entendimento do TSE, pode configurar crime de embaraço ao exercício do sufrágio (art. 297 do Código Eleitoral); (v) as empresas autorizadas por lei a funcionarem no dia do pleito devem se utilizar do bom senso para, em comum acordo com empregados, programarem a liberação para que o direito-dever do voto possa ser exercido em conciliação com a atividade empresarial.

Portanto, o próximo domingo (2) é feriado nacional. O exercício do voto é um direito fundamental de todo cidadão, que, por sua vez, tem o dever e obrigatoriedade de votar. O dia da eleição é de festa cívica e de celebração da democracia. Os empresários do comércio em geral e os trabalhadores devem ficar atentos a tudo isso, como forma de exercer a plena cidadania, respeitando os costumes locais e o que foi negociado na convenção coletiva.

Eduardo Pragmácio Filho é advogado e doutor em Direito do Trabalho pela PUC-SP