Celso Ming
Gargalos do agronegócio
A solução não se restringe a construir silos e armazéns, mas, também, exige a criação de pontos de conectividade entre os modais de transporte
O agronegócio deve entregar nesta temporada safra recorde de mais de 260 milhões de toneladas de grãos. O horizonte dos 300 milhões de toneladas está logo à frente, mas há um sério gargalo que pode prejudicar essa meta. Trata-se da insuficiência de armazenamento.
O Brasil só consegue guardar pouco mais da metade de grãos que produz a cada ano.
Uma indicação da existência desse descompasso é o que vem acontecendo em Mato Grosso. Parte da atual safra de milho está sendo amontoada a céu aberto por falta de espaço em silos e armazéns. É verdade que as colheitas de grãos não acontecem todas ao mesmo tempo. Na Região Centro-Oeste, por exemplo, a soja e a primeira safra de milho são colhidas no início do ano, entre janeiro e março, e a chamada safrinha de milho acontece entre maio e agosto. Quando há escoamento lento demais ou antecipação da colheita, como ocorreu neste ano, os produtores ficam sem espaço e se sujeitam a prejuízos.
Este não é problema isolado. Neste ano, também foram relatados casos de armazenagem de milho ao relento no Paraná. Mas a falta de armazéns também é enfrentada por produtores nas novas fronteiras agrícolas, na Região do Matopiba e no Pará. “Ao contrário do que ocorreu com a produção de grãos, em que a interiorização do agro possibilitou o avanço da fronteira agrícola, a infraestrutura logística no Brasil manteve-se concentrada. Nada menos que 75% da capacidade de armazenamento está nas regiões Sul e Centro-Oeste”, explica Paulo Machado, superintendente da Conab.
O Brasil tem condições de guardar 178,3 milhões de toneladas, ou apenas dois terços da produção esperada para a safra em curso. Em 10 anos, só avançou pouco mais de 23% na capacidade de armazenamento. No mesmo período, a produção anual saltou 61%.
Wellington Andrade, diretor da Aprosoja-MT, observa que esse déficit deve ser tratado de forma estratégica, não só pelos prejuízos que gera ao produtor, como também por questão de segurança alimentar, seja pelo desperdício, seja pela perda de qualidade do produto.
A solução não se restringe a construir silos e armazéns, mas, também, exige a criação de pontos de conectividade entre os modais de transporte para dar mais eficácia ao escoamento, prover investimentos em tecnologia para aprimorar a estocagem e qualidade dos armazéns e monitorar a produção para melhorar as previsões e não pressionar os ciclos entre as safras.
São desafios que exigem desburocratização e criação de linhas de financiamentos a juros mais favoráveis para viabilizar o investimento do setor privado, como explica Felippe Serigati, da FGV. (Com Pablo Santana)
Celso Ming é comentarista de economia