Buscar no Cruzeiro

Buscar

Vanderlei Testa

O sapato mais caro do mundo

(...) tem o valor de 19 milhões de dólares. Foi o design italiano Antonio Vietri que desenhou e projetou cada detalhe com uso de ouro, diamantes (...) e até um fragmento de meteorito

10 de Maio de 2022 às 00:01
Cruzeiro do Sul [email protected]
(Crédito: ARQUIVO DO JCS E REDES SOCIAIS / ARTE: VT)

As lembranças dos sapateiros antigos de Sorocaba renderam pedidos para mais este artigo sobre calçados. Antes de citar os nomes desses artesãos do couro, contarei um pouco da história dos calçados na humanidade. Conta-se em pesquisas sobre a proteção dos pés que tudo começou 10 mil anos antes de Cristo. Naquela época, as pedras no chão fizeram com que o povo pré-histórico deixasse registrado em cavernas o uso de “sapatos” de palha e madeira. Com a experiência do couro dos animais caçados, o uso de calçados surgiu como os protetores dos pés. Há registros de que no transcorrer de centenas de anos, os gregos criaram os primeiros modelos de calçados para cada pé, ou seja, direito e esquerdo, como usamos hoje. Há também citações dos historiadores de Roma, onde o sapato indicava a classe social da pessoa. A cor branca do calçado era destinada para os pés dos cônsules. Os senadores usavam sapatilhas entrelaçadas de cor marrom, como se fosse à bota, com o detalhe de cobrir os dedos. Era um solado com tiras de couro amarrados aos pés e pernas.

Mais recentemente na cronologia da fabricação de calçados, surgiu em 1642, na Inglaterra, um visionário, Thomas Pendleton, que produziu e forneceu quatro mil pares de sapatos e 600 pares de botas para o exército do seu país. Essa modernização de fabricar em grande escala ganhou corpo no século XX, em 1940, com o surgimento da indústria calçadista, substituindo o couro pela borracha e materiais sintéticos. No Brasil, os Estados do Rio Grande do Sul, São Paulo e Santa Catarina são centros produtores de calçados. Existe um status social em marcas e designs inventados por artistas do setor. O maior exemplo que descobri no mundo está em Dubai. O sapato feminino mais caro deste planeta tem o valor de 19 milhões de dólares. Foi o design italiano Antonio Vietri que desenhou e projetou cada detalhe com uso de ouro, diamantes de 30 quilates e até um fragmento de meteorito encontrado em 1576 na Argentina.

Em Sorocaba, os sapateiros recebem em média o valor de R$ 30,00 por conserto. Calcular o sapato mais caro do mundo dividido pelos R$ 30,00, chega-se ao número astronômico e da necessidade do sapateiro fazer três milhões de consertos de sandálias femininas. Em dezenas de anos de atividades de oficinas de conserto, todos os sapateiros do Brasil não conseguem atingir esse patamar dos 95 milhões de reais. As lembranças que os leitores trazem em suas vidas, no entanto, significam mais que a fortuna do sapato de Dubai. É a manifestação de gratidão às pessoas que, de alguma forma, marcaram momentos com a sua missão de sapateiro. Wagner Mathiazzi contou que o seu tio Martinho montou sapataria na rua Cuba, 127, na Parada do Alto, em 1962. O tio Luiz de Almeida assumiu posteriormente a sapataria, mesmo trabalhando na Indústria Votorantim. Ficou conhecido como Luiz Sapateiro e por 50 anos esteve consertando sapatos. Sara Freire se lembra do Mingo Loschiavo, sapateiro na Vila Santana que atendia a todos com a sua generosidade. A Sandra Marques Bonani destacou o sogro, Álvaro Bonani, sapateiro com anos de atividades na Vila Hortência e no Central Parque. Marli de Camargo Jacob levava os sapatos no Jacob sapateiro, no largo do Fórum Velho. Eterna recordação em ver na sua vida o seu pai, Paco, em sua oficina, é o sentimento do filho Valter Prado Bernabé. O José Roberto relatou: “Meu avô Abel tinha a sapataria na rua Aparecida e ele fazia artesanalmente as ‘alpargatas’ que os nordestinos usavam na cidade”. A Natale Casare também destacou o avô José Canavese, sapateiro na rua Hermelino Matarazzo. Ela se lembra que nos anos 60 trabalhava com o avô na sapataria. Márcio Rodrigues destacou o Toninho sapateiro, que há décadas está na rua João Nascimento. Marcio até falou: “Pelo tempo que o Toninho trabalha como sapateiro até hoje, deve ter consertado as botas do bandeirante Baltazar Fernandes!”. E o Mário Montalvão também fez das suas lembranças uma frase cômica: “Me lembro das tachinhas furando o pé, misericórdia”. A Elza Helena levava os sapatos no Marcos Sapateiro, da Vila Amélia. Hoje são o Celso e o Sérgio que trabalham na sapataria da rua Santa Cruz. Wilson Fernandes disse que o Américo Gentile foi um profissional que além de produzir botas com qualidade, ainda ajudava muitos outros sapateiros no ensino do ofício. Ana Gomes ia ao “Charica” quando os seus sapatos precisavam de conserto. A oficina é na rua Pedro Álvares Cabral. A Amélia do Carmo Weber fez uma listinha de elogios ao Cláudio Queiroz, do Jardim Gonçalves. “Ele sempre foi um verdadeiro artista, sapateiro artesão, o melhor que conheci”. Odival Sabadin destacou o seu pai, Guerino Sabadin, na Vila Santana, como exemplo de profissional na EFS e como sapateiro. O sapateiro Orlando Sussi foi destacado pelo Marcelo Graciano. O Pedro Carrasco era impecável nos seus serviços de consertos de calçados, segundo a Bene Rosa. O Wilson Fernandes ia ao Júlio, na rua Fernão Sales. Conhecido como “seu Miguel sapateiro”, na rua Padre Luiz, ele atendia os seus clientes como amigos. Uma delas é a Maria Cecília Ferrari. O Doni Simão disse que o Rubião da rua Rosália Speers era filho do Rubião da rua Cesário Mota, ambos com uma história de sucesso como sapateiros. O Erik Cruz fazia as meias solas dos seus sapatos no Roque Sapateiro, da rua Martins de Oliveira. “Ficava novo depois do conserto”. Lúcia Todesco nasceu na rua Teodoro Kaiser e vizinho da sua casa existia a sapataria do João Dorva. A mãe do João era a “nona” da Lúcia e, como família, eles viveram muitos anos sentindo o perfume do couro da sapataria. O Piolim sapateiro, na Vila Haro, sempre teve um carisma para cuidar com carinho dos sapatos das clientes, como a Eunice Pyaia França. Ivani Garcia se orgulha do pai, o João sapateiro (foto), na avenida Paraguai, Barcelona.

Vanderlei Testa ([email protected]) é jornalista e publicitário. Escreve às terças-feiras no jornal Cruzeiro do Sul