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Nildo Benedetti

Filmes da Netflix: ‘Ataque dos cães’ - (parte 6 de 6)

Artigo escrito por Nildo Benedetti

18 de Março de 2022 às 00:01
Cruzeiro do Sul [email protected]
O filme mostra o percurso tortuoso da vida de Rose (Kirsten Dunst)
O filme mostra o percurso tortuoso da vida de Rose (Kirsten Dunst)". (Crédito: DIVULGAÇÃO)

A divisão de filme em cinco capítulos define cinco etapas decisivas da vida de Phil, desde seu poder sobre todos e todas até sua decadência e morte.

Com os créditos, ouvimos as palavras de Peter citadas anteriormente que funcionam como um prelúdio dos acontecimentos. No final desse prelúdio entramos no capítulo I.

I Abertura, em que todos os protagonistas são apresentados com seus caracteres dominantes: Phil mandão e cruel, mas dependente do irmão. George ponderado e compassivo, Peter aparentemente frágil, sensível e devotado à mãe. É feita a primeira citação de Bronco Harry e a apresentação do restaurante e da casa dos dois irmãos;

II Casamento de George e Rose;

III Convívio na casa, Rose humilhada por quase todos;

IV Entrada de Peter na casa, Rose se destruindo no álcool; homossexualidade de Phil é revelada.

V Aproximação de Phil a Peter para e conquistá-lo sexualmente e ao mesmo tempo agredir Rose. Essa aproximação causa sua morte por Peter.

Se os mesmos capítulos forem tomados com respeito a Rose, observaremos que marcam sua ascensão tanto pessoal como socialmente. Partindo sua jornada de uma sofrida administradora de restaurante, cai ao ponto de se entregar ao álcool e chega a ser uma feliz mulher casada com um homem rico e generoso. Por isto, o filme tem certo caráter feminista, porque pode ser entendido, no seu todo, como alegoria da queda do machismo fraudulento e perverso representado por Phil, sua substituição pelo homem virtuoso que é George e a ascensão da mulher sensata, firme e moralmente forte, representada por Rose.

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Os personagens escondem as paixões que lhes vão na mente e as expressões faciais e movimentos corporais falam muito mais do que suas palavras. Até mesmo a intimidade de George e Rose é escondida ao espectador. As cenas internas são escuras, os objetos que as compõem mal podem ser divisados. É a metáfora da própria obscuridade da psicologia dos personagens. E as tomadas externas de um céu com nuvens carregadas e ameaçadoras antecipam a tragédia que está se desenrolando no filme.

A trilha sonora é uma das forças do filme. A música não é uma reprodução simplória e indigesta dos supostos sentimentos que os personagens estão vivendo. Isto equivaleria a estabelecer uma limitação imperdoável das complexas paixões em jogo e que torna a música insuportável na maior parte do filmes. Em “Ataque dos Cães” a música está em seu melhor uso. Sugiro ao leitor, por exemplo, que atente à música que acompanha a cena em que Peter vai em busca de uma cabeça de gado infectada por Antraz e que se repete quando Phil está tecendo a corda que o levará à morte.

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O título original do filme, “The power of the Dog” (literalmente, “O Poder do Cão”) é mais apropriado do que o título adotado no Brasil, “Ataque de Cães”, porque o cão do filme é apenas Phil1. Ao final do filme, Peter lê no livro dos Salmos, capítulo 22: 20 da Bíblia: “Livre minha alma da espada; minha querida do poder do cão”. O homicídio perpetrado por Peter foi um ato de justiça que livrou a mãe, o padrasto e ele próprio do poder do cão representado por Phil e agora todos podem viver em paz.

Esta série de artigos está incluída no projeto Cine Reflexão da Fundec

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