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Nildo Benedetti

Filmes da Netflix: "Ataque dos cães" (parte 3 de 7)

Artigo escrito por Nildo Benedetti

04 de Fevereiro de 2022 às 00:01
Cruzeiro do Sul [email protected]
Se o leitor pesquisar sobre Alain Turing, ficará perplexo com sua genialidade.
Se o leitor pesquisar sobre Alain Turing, ficará perplexo com sua genialidade. (Crédito: REPRODUÇÃO)

 

Freud introduziu a homossexualidade numa característica universal da sexualidade humana e a humanizou, renunciando a fazer dela uma disposição biológica, ou seja, refutou a ideia de que uma característica sexual seria totalmente preestabelecida no nascimento. Insistiu nos conflitos internos da vida emocional e que tornam a homossexualidade uma escolha inconsciente resultante do histórico do desenvolvimento psíquico do indivíduo a partir do nascimento.

A homossexualidade, entendida como consequência da bissexualidade humana, existe em estado latente em todos os heterossexuais. Freud mostrou que era inútil procurar “curar” um sujeito de sua homossexualidade, uma vez que ela se houvesse instalado, e que o tratamento psicanalítico não deveria ser conduzido com esse objetivo. Acrescentou que, vez por outra, podia-se desobstruir o caminho que levava ao sexo oposto: nesse caso, o paciente se tornava bissexual. Mas, esclareceu: “transformar um homossexual plenamente desenvolvido num heterossexual é uma empreitada com tão poucas probabilidades de êxito quanto a operação inversa”.

Numa carta de 9 de abril de 1935 a uma norte-americana que tinha um filho homossexual, Freud escreveu: Não tenho dúvidas que a homossexualidade não representa uma vantagem, no entanto, também não existem motivos para se envergonhar dela, já que isso não supõe vício nem degradação alguma. Não pode ser qualificada como uma doença e nós a consideramos como uma variante da função sexual (...). É uma grande injustiça e também uma crueldade, perseguir a homossexualidade como se esta fosse um delito. Ao me perguntar se eu posso lhe oferecer a minha ajuda, imagino que isso seja uma tentativa de indagar acerca da minha posição em relação à abolição da homossexualidade, visando substituí-la por uma heterossexualidade normal. A minha resposta é que, em termos gerais, nada parecido podemos prometer”.

Os herdeiros de Freud não seguiram suas diretrizes frente à homossexualidade e mostraram extrema intolerância. A partir de 1921, os psicanalistas de Berlim consideravam que os homossexuais eram incapazes de ser psicanalistas. Ernest Jones declarou que a homossexualidade era “um crime repugnante”. Sob a pressão de Jones e dos berlinenses, a homossexualidade passou novamente a ser considerada uma “tara”.

Ao longo do tempo, por mais de 50 anos, sob a crescente influência das sociedades psicanalíticas norte-americanas, os homossexuais foram considerados inaptos para o tratamento psicanalítico, a menos que a análise tivesse por objetivo orientá-los para a heterossexualidade. Um caso paradigmático da cruel hostilidade contra a homossexualidade ocorreu com o matemático e filósofo britânico Alan Turing, amplamente considerado o pai da computação teórica e da inteligência artificial. Apesar de sua genialidade, nunca foi totalmente reconhecido em seu país de origem durante sua vida. Foi processado judicialmente em 1952 por atos homossexuais e, para escapar à prisão, aceitou o tratamento de castração química. Faleceu em 1954, aos 41 anos, por envenenamento por cianeto, que pode ter sido acidental ou suicídio. Apenas em 2013 a rainha Elizabeth II concedeu a Turing perdão póstumo.

Continua na próxima semana.

Está série de artigos está incluída no projeto Cine Reflexão da Fundec

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