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A boiada, o gás metano e o clima

Artigo escrito por Celso Ming

10 de Novembro de 2021 às 00:01
Cruzeiro do Sul [email protected]
(Crédito: REPRODUÇÃO / INTERNET)

Não deixa de ser grande ironia. O mesmo governo que há alguns meses recomendava que fosse aproveitada a confusão da pandemia para “passar a boiada” agora se compromete na Cúpula do Clima (COP-26) a reduzir em até 30%, até 2030, a emissão de gás metano.

O metano é tão nocivo quanto o gás carbônico. É emitido em aterros sanitários (onde pode ser queimado e aproveitado para produção de energia elétrica), nos vazamentos nas infraestruturas de petróleo e gás, por fermentação entérica, o chamado “arroto do boi” e no manejo de dejetos animais.

Em 2020, o Brasil gerou 20,2 milhões de toneladas de metano. Como apontam dados do Sistema de Estimativa de Emissões de Gases do Efeito Estufa, a agropecuária brasileira foi responsável por 71,9% dessas emissões, ou por 14,5 milhões de toneladas.

Dependendo ainda de quanto será observado por aqui, o acordo terá forte impacto sobre a pecuária brasileira. O rebanho bovino era de 218 milhões de cabeças em 2020, uma para cada brasileiro. O chefe-geral da Embrapa Pecuária Sudeste, Alexandre Berndt, garante que o setor tem condições de reduzir as emissões sem recorrer a novas tecnologias. Bastará a aplicação das já conhecidas, por meio do melhoramento genético, nutrição animal e manejo de pastagem.

Essas técnicas reduzem o tempo de abate dos animais que, ainda hoje, permanecem até quatro anos a fermentar no pasto. A queda das emissões de metano também se obtém com o controle da dieta por meio de aditivos alimentares, alguns já estudados pela Embrapa. Esses recursos têm lá seus custos, que, no entanto, tendem a ser compensados pela melhora da qualidade da carne e do leite e maior faturamento nas vendas.

Berndt ainda observa que é possível capturar carbono da atmosfera pela adoção de sistemas que integram produção de grãos, carnes e madeira simultaneamente no mesmo local. “A integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF) é mais resiliente às mudanças do clima e quando as árvores crescem conseguem capturar carbono, o que compensa as emissões de metano pelos animais na mesma área”, explica.

Essa transição não se faz espontaneamente. Será preciso conscientização. Quem pode e deve fazer isso? Claro, é tarefa do Ministério da Agricultura e dos incentivos que deverão ser criados, como pede Muni Lourenço, vice-presidente da Confederação Nacional da Agricultura. Mas, até por interesse próprio, o setor deve se apresentar para o jogo. Esse esforço pode ajudar a atrair o apoio financeiro dos países avançados agora mais empenhados em atacar o efeito estufa. (com Pablo Santana)

Celso Ming é comentarista de economia.