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Inflação: o pior já passou?

Artigo escrito por Celso Ming

13 de Outubro de 2021 às 00:01
Cruzeiro do Sul [email protected]
(Crédito: REPRODUÇÃO / INTERNET)

Para o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, a inflação de setembro, de 1,16% na variação mensal, foi a pior e o pior já passou. Daqui para a frente, calcula o guardião da moeda, a inflação vai se desacelerar. Tomara que essa previsão esteja correta. É esperar para conferir

Outras vezes, Campos Neto proclamou certezas dessa ordem. Há alguns meses, por exemplo, avisava que o surto inflacionário teria curta duração e que, por isso, o Copom esperaria para passar a puxar pelos juros. Não foi o que aconteceu. Os preços dispararam e, a partir de março deste ano, o Banco Central se viu obrigado a apertar o torniquete da política monetária para muito além do imaginado, processo que só vai parar quando a inflação estiver convergindo para a meta -- assegura Campos Neto. A alta partiu dos 2,0% ao ano e, em seis meses, saltou para 6,25%, podendo chegar aos 8,0% ao fim do ano.

É possível que a inflação dos alimentos recue alguma coisa além do que já ocorreu em setembro. Mas não é o que se vê no campo da energia elétrica, dos combustíveis, dos serviços e dos preços administrados -- estes últimos, aqueles que estão sob controle do setor público.

O presidente do Banco Central se apoia em dois pressupostos para apostar em recuo da inflação medida em 12 meses, que acumula alta de 10,25%, a partir deste mês de outubro: o de que essa esticada de preços tem como causa principal choques de oferta, a relativa desorganização dos fluxos de produção e distribuição em consequência da pandemia, que tende a se recompor; e, no Brasil, o de que acontece num terreno de demanda relativamente contida pelo crescimento baixo, pelo desemprego e pela perda de renda.

Como alta dos juros só tem eficácia quando se trata de atacar uma demanda excessiva, fica a dúvida sobre até que ponto a política restritiva do Banco Central é eficaz.

De todo modo, foi e continua sendo preciso agir sobre os efeitos secundários da inflação que, no Brasil, viciado em reajustes automáticos de preços (indexação), é fator importante.

O diabo é que algumas das causas da atual virulência inflacionária continuam atuando. Os preços internacionais dos combustíveis tendem a subir. O barril do petróleo tipo Brent ultrapassou nesta semana os US$ 83 e bom número de analistas entende que em pouco tempo poderá se aproximar dos US$ 100. Embora o governo tente conter os reajustes dos combustíveis, sabe-se lá à custa de quais malabarismos, parecem inevitáveis novos aumentos.

Até porque há o fator câmbio. O acúmulo de incertezas vem tomando corpo, a desvalorização do real (alta do dólar) empurra para cima os preços não apenas dos combustíveis, mas, também, dos produtos cuja cotação está amarrada ao comportamento da moeda estrangeira, caso dos alimentos, de inúmeras matérias-primas e das passagens aéreas. Ou seja, medida em 12 meses, a inflação pode recuar, mas não dá ainda para dizer o mesmo da que virá mês a mês, sobretudo depois deste outubro.

Estamos diante de um fenômeno mundial. Em dezembro de 2020, a inflação acumulada em 12 meses nos Estados Unidos estava em 1,4%; em agosto passou a 5,3%; e, no mesmo período, os preços do varejo (custo de vida) da área do euro, saltaram do -0,3% (negativos) para 3,0%. Na semana passada, a diretora-gerente do Fundo Monetário Internacional, Kristalina Georgieva, advertiu que “as perspectivas da inflação global continuam altamente incertas”.

Os grandes bancos centrais preparam alta dos juros que, por sua vez, tenderão a valorizar o dólar e o euro. Ou seja, mais inflação poderá ser exportada para o Brasil na forma de encarecimento dos produtos cotados em moeda estrangeira. Por essas e outras razões, não dá para confiar demais na expectativa de que depois de setembro o pior ficará para trás.

Celso Ming é comentarista de economia.