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Filmes da Netflix: ‘War machine’

Artigo escrito por Nildo Benedetti

27 de Agosto de 2021 às 00:01
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O general Glen McMahon (Brad Pitt): muita pose, dinheiro, armas e resultado desastroso.
O general Glen McMahon (Brad Pitt): muita pose, dinheiro, armas e resultado desastroso. (Crédito: DIVULGAÇÃO)

Caro leitor, nos últimos dois artigos dos cinco que escrevi sobre “O vale das sombras”, apontei várias razões que contribuíram para uma redução de guerras nas últimas décadas. Uma delas dizia respeito às guerras malsucedidas e o caso do Afeganistão, tratado neste “War Machine” (“Máquina de guerra”, título em português), é um exemplo didático e atual. Foi dirigido pelo australiano David Michôd de 2017.

Em 2001, uma coligação comandada pelos Estados Unidos invadiu o Afeganistão para capturar Bin Laden, articulador do ataque terrorista de 11 de setembro de 2001 às Torres Gêmeas e ao Pentágono. A maior parte do país vinha sendo governado desde 1996 pelo Taleban, movimento fundamentalista islâmico nacionalista, que foi rapidamente derrotado pela coligação.

Passadas duas décadas o Taleban volta a governar o país depois de uma campanha militar fulminante. Estima-se que dois trilhões de dólares tenham sido gastos na guerra pelos Estados Unidos, parte dos quais foi destinada ao exército regular afegão que foi arrasado nos campos de batalha. Realiza-se assim, depois de 12 anos, o que, já em 2008, o New York Times e outros meios de comunicação importantes sugeriam: que os Estados Unidos estavam perdendo a guerra.

O filme é baseado no livro “A história selvagem e aterrorizante da guerra da América no Afeganistão”, em tradução livre, do jornalista norte-americano Michael Hastings. Em junho de 2010 ele publicou uma entrevista na revista Rolling Stones em que o comandante do Exército dos EUA no Afeganistão, Stanley McChrystal, criticava abertamente as autoridades civis da Casa Branca. Obama retirou-o do comando. O general Glen McMahon, protagonista do filme, é uma caricatura de McChrystal. É um homem carregado de condecorações na farda, cheio de poses, receptivo à lisonja, com grande “habilidade de bloquear o mundo real”, sinal de insanidade. Ele é uma representação da máquina de guerra vulnerável que se crê invencível.

O filme é uma sátira e o leitor terá o prazer de constatar que um modo eficaz de tratar uma insensatez é mostrar seu lado ridículo: a figura do presidente Karzai, marionete dos Estados Unidos, e as eleições fraudulentas para reelegê-lo; a subserviência do capitão do exército afegão aos soldados americanos (faz lembrar alguns políticos brasileiros quando visitam Trump); a atitude dos americanos que, incapazes de compreender diversidades culturais, tentam impor seus valores ocidentais como se fossem os únicos válidos; e muito mais.

O narrador se refere aos combatentes afegãos como qualquer indivíduo faria se invadissem o seu país. Se o invasor quiser prosseguir fingindo que pode vencer, diz ele, acaba ficando com a opção de tentar convencer que está ali para ajudar o país invadido. É isso que faz Glen quando afirma que os americanos estão estendendo a “mão que ajuda” cumprido a missão de reconstruir o país, oferecer segurança, estradas, escolas, empregos e uma vida longa e próspera. Ao que um afegão realista lhe pede um favor: vão embora.

O narrador afirma também que os Estados Unidos parecem desesperados para estar sempre em guerra e o que conseguem é gerar somente mais inimigos, tudo em nome de manter os Estados Unidos seguros.

Na próxima semana escreverei sobre “Leave no trace” (“Não deixe rastro”).

Esta série de artigos está incluída no projeto Cine Reflexão da Fundec

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