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Dos desafios da missão que é o educar

Artigo escrito por Éric Diego Barioni

25 de Agosto de 2021 às 00:01
Cruzeiro do Sul [email protected]
Éric Diego Barioni.
Éric Diego Barioni. (Crédito: Divulgação)

Ainda me lembro bem do dia em que eu estava sentado no banco de trás do carro dos meus pais. Era um dia ensolarado, eu estava atrás do banco onde minha mãe estava sentada e acabávamos de sair de uma consulta médica. Aquele adolescente iria talvez para a primeira ou segunda cirurgia urológica e, ainda que muito ansioso, ele -- o adolescente -- estava encantado com o atendimento e conhecimentos daquele médico, o doutor Douglas Harder. Foi passageiro, mas naquele carro após a consulta pensei na possibilidade de seguir uma carreira na área da saúde. Eu sempre fui um menino muito dedicado e proativo, desde a infância e de maneira orgânica. Porém, na escola, eu deixei de acreditar nisso.

Hoje, enquanto educador, penso diferente e consigo enxergar algumas coisas com mais clareza. No entanto, se, há alguns anos, você me perguntasse, eu lhe diria: Não fui um bom estudante durante o ensino médio e adolescência. Não reprovei, mas não conseguia bons resultados. Para mim, as aulas eram maçantes e repetitivas e, sempre na trave, a cada reunião de pais eu experimentava o calor e a energia do inconformismo dos meus pais. Os meus pais não admitiam boletins medianos e um comportamento como o meu, e os meus professores talvez não atribuíssem valor às particularidades dos estudantes -- em especial às minhas -- e investissem muita energia num modo de ensino pouco diverso e que certamente dificultava o processo de ensino e aprendizagem de maneira significativa intra e extra sala de aula.

Este mesmo Éric, acredite, era proativo e participativo, e minha relação extra sala de aula com a direção e professores sempre foi positiva e muito proveitosa. Na escola participava assiduamente da fanfarra, da rádio, de grupos musicais e teatrais, auxiliava na organização de eventos escolares, feiras, era sempre muito educado e gentil e gostava de falar, se expressar, enfim. Ali talvez estivesse evidente várias habilidades, vários pontos positivos que poderiam ser utilizados a favor do processo de ensino e avaliação do aprendizado em sala de aula, mas isso não acontecia. As aulas monótonas, aquele velho ditado maçante e as lousas lotadas sempre se repetiam e não faziam sentido algum.

Vez ou outra leio ou ouço de colegas professores sobre estudantes que são bons em sala de aula, mas que não necessariamente se apresentam tão bons quanto o são em sala de aula, no ambiente profissional, e vice-versa. Essa percepção é real e, em partes, se deve ao mesmo fato de que nós -- os professores/orientadores -- talvez ainda não tenhamos incorporado e aprendido que os alunos são verdadeiramente diferentes, aprendem de forma diferente, possuem habilidades diferentes e cabe ao professor a difícil, porém necessária e inovadora, tarefa de identificar e potencializar estas competências e habilidades, significando e diversificando as formas de ensino e avaliação do aprendizado, inovando em sala de aula, extraindo de cada estudante o máximo que ele pode dar, indo ao encontro de seus interesses e sua realidade, fazendo-os reconhecer as suas fragilidades e potencialidades e preparando-os desta forma para um futuro de desafios cada vez mais tecnológicos.

Certamente aplicar tudo isso é muito difícil. É um processo constante de desconstrução e reconstrução e aprendizado. Nós somos diferentes, partimos de lugares e condições diferentes, aprendemos de formas diferentes e precisamos encontrar significado naquilo que aprendemos e vamos aprender e precisamos entregar o significado daquilo que ensinamos e vamos ensinar. Passar uma régua única sobre a complexidade e particularidades de cada um é jogar estes alunos ao chão. Nós precisamos despertar esses talentos e auxiliar os alunos a encontrar a sua vocação e desta forma eles irão reconhecer e aprimorar com conhecimentos as suas habilidades e poderão se tornar cidadãos mais livres, iguais e conscientes sobre o futuro e os desafios de nosso mundo.

Éric Diego Barioni é biomédico, mestre e doutor em Toxicologia e Análises Toxicológicas pela FCF/USP/SP e professor na Uniso. E-mail: [email protected]