Liberdade para amar!
Artigo escrito por Dom Julio Endi Akamine
A liberdade é um bem precioso. Sem ela, a vida se torna infra-humana. E privar uma pessoa dela é condená-la a uma vida desumana. A ética cristã é moral de liberdade, e a vida cristã é possível pelo dom da liberdade para a qual Cristo nos libertou. Nesse sentido, a liberdade cristã traz a forma da liberdade de Jesus de Nazaré.
Como Ele viveu a liberdade? Como foi livre? Para responder parcialmente a essas perguntas, recordo um episódio que pode ser considerado paradigmático da liberdade de Jesus.
Jesus frequentou a companhia de pecadores públicos e de cobradores de impostos. Isso não significa dizer que os publicanos não coloquem Jesus em dificuldades (Mt 17,22-27). A pergunta dos cobradores de impostos a Pedro põe o problema: “O vosso mestre não paga o imposto do Templo?”.
A resposta de Jesus é clara: se o templo é a casa de Deus, o seu Filho não deve pagar tributo. Desta isenção participam também os outros filhos. Importante não perder esse detalhe: a consciência de Jesus se manifesta com toda a sua simplicidade e força: Ele revela a sua consciência de ser Filho, e de que Deus é o Pai! O modo como Jesus vive, prega e reza não é a do homem diante de Deus. É a do Filho perante o Pai. Evidentemente todos nós professamos que Jesus é homem e Deus. Nessa resposta, porém, se manifesta a consciência que Jesus tem de si mesmo: Ele é o Filho e, por isso, goza dessa liberdade filial. Jesus é livre, sendo Filho.
Essa é, de fato, a grande riqueza e a belíssima condição dos filhos: a de serem livres. Nada mais belo, desejável do que a liberdade dos filhos de Deus. É ela que nos torna semelhantes a Deus.
Prestemos atenção: trata-se da liberdade filial, que é, ao mesmo tempo, estar livre de todos os tributos e, por força da própria liberdade, estar obrigado aos “deveres” da relação filial com o Pai e da relação de fraternidade com os outros, próximos e distantes.
Jesus toma a decisão de mandar Pedro buscar um meio de pagar o imposto do Templo. Ele não tem a obrigação de pagar nenhum tributo. O único é o tributo da relação filial e o da relação fraterna, mas, por meio de um milagre, Ele paga o imposto para ele e para Pedro a fim de não escandalizar as pessoas.
“Não escandalizar os outros”. Como é bonita essa liberdade de Jesus. Ele renuncia até à sua própria isenção do imposto cobrado dos estrangeiros e não dos filhos para não escandalizar os outros. Essa atitude não é algo pontual na sua vida; Jesus não fez isso somente nessa ocasião. Da mesma forma como Jesus nunca usou do seu poder para proveito pessoal, assim jamais se serviu de sua liberdade para causar dano ao outro.
A liberdade de Jesus é a liberdade filial e fraternal. Para não escandalizar, Jesus se sente livre até mesmo para pagar o imposto do qual era isento. Ele é livre para amar: renuncia ao seu direito legítimo para não ferir ou prejudicar os direitos dos outros. A verdadeira liberdade é, de fato, liberdade para amar.
Sempre somos tentados nesse sentido: viver a própria liberdade sem respeitar o bem dos outros. O critério do Evangelho, porém, nunca foi o da própria vantagem e privilégio! É sempre o bem do outro. O bem do outro está acima do meu pessoal. Essa é a liberdade da caridade, a liberdade de amar, a liberdade filial e fraternal! A liberdade cristã não é a observância da lei, nem a de transgredir a lei: é a liberdade para amar o irmão. Nada mais exigente, laborioso, sublime do que amar! Nada mais livre, mais alegre do que amar!
Dom Julio Endi Akamine é arcebispo metropolitano da Arquidiocese de Sorocaba.