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Filmes da Netflix: "Ethel e Ernest"

Artigo escrito por Nildo Benedetti

16 de Julho de 2021 às 00:01
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Ethel e Ernest vivem uma história familiar cheia de amor em quatro décadas turbulentas.
Ethel e Ernest vivem uma história familiar cheia de amor em quatro décadas turbulentas. (Crédito: DIVULGAÇÃO)

“Ethel e Ernest”, de 2016, é uma animação, dirigida por Roger Mainwood, que discorre sobre assuntos sérios. Foi desenhada à mão e focaliza principalmente a história dos pais do escritor e ilustrador britânico Raymond Briggs. É uma obra de memórias, que começa em 1928 e se prolonga por mais de 40 anos.

É claro que o relato de Raymond é a transcrição, menos ou mais literal, dos fatos narrados pelos pais, que provavelmente estão cheios de esquecimentos, fantasias e idealizações comuns no ser humano quando fala ou escreve sobre si mesmo, sobre os que lhe são caros, sobre inimigos pessoais ou ainda sobre políticos, religiosos etc. Ou seja, voluntária ou involuntariamente, estamos sempre adulterando os acontecimentos.

Mas o filme faz pensar sobre o percurso da existência humana. Começa com o flerte da recatada Ethel, empregada de uma família da classe alta inglesa, com Ernest, um entregador de leite. O casal se mostra cheio de planos de futuro, coroado com o nascimento de Raymond Briggs. Mas, como ocorre na vida de todos os humanos, o casal vai física e mentalmente decaindo com o tempo. A vida do idoso é, em menor ou maior grau, fonte de apatia, solidão, recordações, sentimento de inutilidade e pensamento voltado cada vez mais para a morte iminente. A demência que assola Ethel é, com menor ou maior gravidade, um dos inúmeros flagelos companheiros da velhice. A ideia de que a velhice é a “melhor idade” é de colossal hipocrisia e isto o filme nos mostra muito bem.

“Ethel e Ernest” documenta os avanços tecnológicos daquelas quatro décadas, incluindo a substituição do jornal impresso pelo rádio e depois pela televisão, por meio dos quais Ernest gradualmente vai nos informando da realidade daquela época tumultuada. Dentre os fatos marcantes relatados no filme estão: a grande depressão que se iniciou com o crack da bolsa de Nova York em outubro de 1929 e se espalhou pelo mundo a partir da década de 30 (historiadores apontam o fenômeno como um dos responsáveis pela ascensão de Hitler na Alemanha, país que se tornou a grande potência militar da Europa); a Conferência de Munique, de 1938, quando o Primeiro-Ministro britânico Neville Chamberlain, ignorando as violações de Hitler a tratados internacionais, acreditou nas garantias oferecidas pelo líder nazista para manter a paz na Europa, dando a Tchecoslováquia à Alemanha; a tomada da Polônia pelo exército alemão; a declaração de guerra à Alemanha pela Inglaterra e França; a invasão da União Soviética; o bombardeio de Londres; as comemorações do fim da guerra, em 1945; o recrutamento do filho do casal, Raymond, para a combater na guerra da Coréia.

O filme menciona também o estado de bem-estar social implantado pelo Partido Trabalhista e faz breve referência à ascensão da baronesa Margareth Thatcher na política. Esta, alguns anos mais tarde, liquidaria grande parte dos direitos trabalhistas e, juntamente com o presidente dos Estados Unidos Reagan, levaram à adoção da política econômica do neoliberalismo.

Na próxima semana escreverei sobre “No vale das sombras” (In the vallay of Elah”).

Esta série de artigos está incluída no projeto Cine Reflexão da Fundec

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