Palavra nova
Artigo escrito por Edgard Steffen
Cringe to act in a servile manner; fawn.
(Webster’s Compact Edition)
Durante a leitura dos jornais, enquanto tomávamos café da manhã, minha esposa pergunta: Tem uma palavra aqui que nunca li. Você sabe o que é cringe? Minha primeira reação foi “chutar” -- quem se lembra dos tempos de faculdade, conhece bem esta gíria -- que seria mais um verbete inglês entre os tantos que invadem a inculta e bela em tempos de globalização e alta tecnologia. Venci a preguiça. Confessada minha ignorância, saí de fininho e fui ao Webster buscar o esquisito termo. Cringe é verbo e significa comportamento servil ou ato de louvor fingido (fawn), conceitos que minha curiosidade escolheu entre as definições expressas na edição compacta do dicionário.
Quem me ajudou no melhor entendimento e inserção do termo no contexto foi o artigo de Gilberto Amêndola (Uma palavra entre gerações -- Estadão -- pag. H6, 28/06/2021). Na internet, o que era verbo virou adjetivo ou substantivo usados para designar algo vergonhoso, vergonha alheia ou o conhecidíssimo pagamento de mico. Teria nascido de provocações entre as recentes gerações. Os da Geração Z (nascidos entre 1996 e 2010) criticam hábitos e escolhas culturais dos Millenials (ou geração Y, isto é, dos nascidos entre 1981 e 1995). O que foi moda para uma costuma ser mico para a subsequente. A efervescência atraiu a atenção dos que estudam e dos que faturam com a bem-humorada troca de farpas e desaforos nas redes. Na edição seguinte do mesmo jornal, cringe reaparece no texto de outros dois excelentes jornalistas.
A divisão geracional, separadora de grupos a partir do ano em que nascem, aguçou minha curiosidade. Apelei para o casal Mr. Google e Mrs. Wikipedia. Aprendi. A base é o ano de nascimento, mas características grupais são consideradas a partir dos adolescentes e jovens adultos, faixa etária em que modismos e comportamentos se estabelecem e se multiplicam freneticamente. Os Baby-boomers (1946-1964) receberam esta denominação pela alta taxa de natalidade no pós 2ª Grande Guerra Mundial. Seriam combativos, disciplinados, idealistas na luta pelos direitos e pouco afeitos às lides com eletrônicos. Grupo onde apareceu o rock. Foram sucedidos pela geração X, mais turbulenta, hippie, influenciada pela expansão da televisão que, por sua vez, trouxe os horrores da Guerra do Vietnã para dentro de seus lares. Seguiram-se os Y ou Millenials regidos pela comunicação instantânea na internet e por guerras e conflitos mal justificados. Registram tudo em computadores miniaturizados.
Individualistas, adoram e praticam selfies. Parênteses. Estou consciente de que este resumo é falho, superficial e cringe. Feito para caber neste espaço e na minha longeva cachola.
Por falar em longevidade, sobreviventes como eu, nascidos nos anos 30, conviveram e se assustaram com boomers, millenials, zês e seus modismos, manias, comportamentos, roupas, músicas e tudo mais. Nascemos no 20, mas vivíamos como nossos avós do século 19. Nossos pais pertenceram a “Lost generation” do pós 1ª Grande Guerra. Loucos anos do jazz, do charleston, da grande depressão, da Mafia e FBI, do colonialismo sustentado a manu militari.
Segundo a classificação geracional, quem nasceu entre 1925 e 1945, compôs a “Geração silenciosa”. Usava paletó e gravata. Andava em círculos na praça central ao som da banda ou dos alto-falantes. Dançava boleros, sambas-canção e foxes. De rosto colado. E era gostoso. Vivíamos a era do rádio. Éramos acomodados, leais, tradicionalistas. Conforme análise do deputado federal Luiz Flávio Gomes, a geração “da casa para o trabalho e do trabalho para casa”. A essa dinâmica eu acrescentaria “à igreja” (pelo menos uma vez por semana) para o fortalecimento de nossa fé e “ao cinema” que era nossa janela para conhecer o mundo.
Se os X, Y e Z nos avaliassem, o gostoso para nós seria cringe para eles. Pena!
Edgard Steffen ([email protected]) é médico, escritor e membro da Academia Sorocabana de Letras (ASL).