Buscar no Cruzeiro

Buscar

Aprender Ciências com Monteiro Lobato

23 de Abril de 2021 às 00:01
Cruzeiro do Sul [email protected]
Paulo Sergio Bretones
Paulo Sergio Bretones (Crédito: Arquivo Pessoal)

Paulo Sergio Bretones

O Dia Nacional do Livro Infantil é comemorado em 18 de abril, data escolhida em homenagem ao nascimento de Monteiro Lobato. Autor do Pré-Modernismo brasileiro, Lobato deixou uma grande contribuição para a literatura infanto-juvenil com mais da metade de seus livros. Inúmeras edições foram publicadas por diversas editoras e até em quadrinhos imortalizando os personagens do Sítio do Picapau Amarelo como Dona Benta, Pedrinho, Narizinho, Tia Nastácia, Emília, Visconde de Sabugosa e outros. O Sítio como série de TV foi transmitido muitas vezes e com a participação de uma variedades de atores desde a década de 1960 pelas TVs Tupi, Cultura, Bandeirantes, Globo e mais recentemente como desenho animado na Globo e no Cartoon Network. Várias séries foram produzidas em DVD e hoje muita coisa está disponível no Youtube. Lobato inseriu nas histórias vários elementos da cultura brasileira desde lendas até costumes de quem vive no interior e foi além com elementos da literatura universal e até a mitologia grega. Mais especificamente, o autor gostava muito de ciências e acreditava que a sua divulgação e ensino seriam muito importantes para o desenvolvimento da nossa sociedade. Por isto, é importante chamar a atenção para a leitura desses livros que são ótimos recursos para ensinar e aprender ciências.

Como exemplos, os livros “História das Invenções”, “Serões de Dona Benta”, “Viagem ao Céu” e “O poço do Visconde” são excelentes. Em História das Invenções, Dona Benta conta a história do mundo, desde a origem do Universo, surgimento e evolução da vida na Terra, da espécie humana, a agricultura e artefatos até a invenção do Visconde de Sabugosa, que na obra toda faz papel de cientista. Em “Serões de Dona Benta” são abordadas Física, Química, Biologia e até a Astronomia, que também aparece em “Viagem ao Céu”. “O poço do Visconde” trata da Geologia e da importância de investimentos em estudos pela busca de petróleo em solo nacional. Este tema também foi tratado no livro “O escândalo do petróleo”, que mencionava o descaso do governo em preferir a submissão do País às companhias petrolíferas norte-americanas. Lobato admirava o modelo americano, mas defendia a liberdade econômica de nosso País e considerava que as riquezas naturais como o petróleo e a siderurgia eram muito importantes para o progresso.

Vários estudos discutem a relação da literatura de Monteiro Lobato com o ensino de ciências, sobre a história e a natureza da ciência, a motivação para estudar ciência, o método científico, concepção empirista ou revolucionária da ciência e suas aplicações. A literatura de Monteiro Lobato mostra a importância que o autor dava às relações do homem com a ciência e se contrapunha à literatura infantil da época baseada nos contos de fadas europeus. Suas histórias tinham duas vertentes principais. A primeira relacionada à informação e à formação com abordagem pedagógica sobre uma variedade de campos do conhecimento. A segunda voltada à ficção onde a realidade se junta com a fantasia na resolução de problemas no contexto de seus personagens. A abordagem do conhecimento científico na literatura infantil de Lobato está diretamente ligada ao meio social, cultural e político que viveu. Além da obra infantil de Monteiro Lobato, muitas outras podem ser usadas para estimular a aprendizagem das ciências. Minha sugestão para Pais e professores de alunos dos anos iniciais é que estimulem as crianças à leitura das obras de Monteiro Lobato, mas fazendo discussões levando em conta a atualização de informações e discutindo as questões sociais também. É importante lembrar que as obras têm quase 100 anos e que muitas informações e conceitos estão ultrapassados, mas são ótimos elementos que podem ser discutidos no contexto atual.

Infelizmente Lobato em alguns momentos teve abordagens preconceituosas e racistas como no caso do caipira Jeca Tatu e Tia Nastácia, sempre dócil negra que cuidava de todos. Mesmo assim, vale a pena a leitura das obras com as crianças por serem elementos para gerarem reflexões e discussões que contribuam para acabar de uma vez com o racismo e qualquer tipo de preconceito.

Os vídeos disponíveis na Internet poder ser aliados ao incentivo à leitura dos livros. Eu me lembro de que minha mãe, Dona Maria de Lourdes combinava comigo que eu deveria ler os livros de Monteiro Lobato durante, digamos, meia hora por dia ou alguns dias por semana. Isto me incentivou a ler outros livros que ela e meu pai me traziam na sequência. Era uma coleção que meu avô havia adquirido nos anos 1950 de capa dura e verde.

Um exemplo de atividade aparece no livro didático de Ciências para 5ª série do professor Paulo Bedaque em uma coleção da editora Saraiva em parceria com César e Sezar. Logo no início do primeiro capítulo traz um texto de “Viagem ao Céu” onde ocorre um diálogo de dona Benta com Pedrinho: -- Que é, vovó, que a senhora está vendo lá em cima? Eu não estou enxergando nada -- disse Pedrinho. Dona Benta não pôde deixar de rir-se. Pôs nele os olhos, puxou-o para o seu colo e falou: -- Não está vendo nada, meu filho? Então olha para o céu estrelado e não vê nada? -- Só vejo estrelinhas -- murmurou o menino. -- E acha pouco, meu filho? Você vê uma metade do universo e acha pouco? Pois saiba que os astrônomos passam a vida inteira estudando as maravilhas que há nesse céu em que você só vê estrelinhas. É que eles sabem e você não sabe. Eles sabem ler o que está escrito no céu -- e você nem desconfia que haja um milhão de coisas escritas no céu...

A leitura é importante para todas as áreas. Quem lê bastante aprende a se explicar e a entender sobre qualquer assunto. Numa frase que ficou famosa de Monteiro Lobato, ele disse: “Quem mal lê, mal ouve, mal fala, mal vê”.

Paulo Sergio Bretones é professor do Departamento de Metodologia de Ensino/UFSCar