Editorial
Operação abafa tenta sepultar abertura de CPMI
Dos representantes de Sorocaba e região, na Câmara dos Deputados, só Jefferson Campos (PL) assinou o requerimento que prevê a abertura da CPMI
Muitos mistérios estão escondidos por trás dos ataques à Praça dos Três Poderes, em Brasília, no dia 8 de janeiro. Depois de acusações avassaladoras a apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro, o governo atual deflagrou uma verdadeira operação abafa, para dificultar as investigações sobre o caso. Como onde há fumaça, há fogo, está mais que na hora que toda a história daquele dia seja passada em pratos limpos.
Horas após os atos de vandalismo, o Partido dos Trabalhadores e seus aliados defendiam fiscalização rigorosa e a criação de uma CPI no Senado. Assinaturas até chegaram a ser colhidas. O grito de guerra na época era “Sem Anistia”, pedindo a condenação sumária dos manifestantes. Só que, no andamento das investigações, a situação foi mudando e já pairam sérias dúvidas da participação ou omissão de alguns representantes do novo governo na orquestração dos atos. Personagens importantes no cenário de destruição que se viu foram presos e desapareceram sem que suas histórias viessem a público. O falante ministro da Justiça, Flávio Dino, submergiu diante de alguns documentos apresentados por parlamentares ligados ao ex-presidente Bolsonaro. Lula colocou em segredo as esclarecedoras imagens do dia dos ataques.
A situação ficou mais grave, logo depois do Carnaval, quando a oposição anunciou ter conseguido o número de assinaturas necessário para a abertura de uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito. Desde então o Governo, que já apostava na operação abafa, intensificou as ameaças e ofertas a deputados que assinaram o requerimento da CPMI.
O Palácio do Planalto deflagrou, nesta semana, uma operação para convencer deputados e senadores a retirar assinaturas do requerimento. A ofensiva inclui oferta de nomeações para cargos de segundo escalão nos Estados, como diretorias do Banco do Nordeste (BNB), além de superintendências da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf) e do Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs).
O governo também pressiona ministros de partidos aliados, principalmente do União Brasil, para ajudar na missão “abafa CPI”. Há três dias, quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu manter o ministro das Comunicações, Juscelino Filho, apesar das graves acusações que pesam contra ele, avisou que exigiria contrapartida no Congresso. Na avaliação do Planalto, criar uma comissão parlamentar agora atrapalharia votações importantes, como a da nova âncora fiscal e a da reforma tributária.
O autor do pedido de investigação dos atos de 8 de janeiro, deputado André Fernandes disse que depois de tanta pressão, três colegas -- Chiquinho Brazão (União Brasil-RJ), Célio Silveira (MDB-GO) e Pastor Gil (PL-MA) -- retiraram as assinaturas. “Eles estão retirando, mas a gente está colocando mais”, minimizou. Fernandes disse que outros cinco deputados -- Milton Vieira (Republicanos-SP), Luiz Nishimori (PSD-PR), Junior Lourenço (PL-MA), Celso Russomanno (Republicanos-SP) e Luciano Vieira (PL-RJ) -- aderiram. Atualmente, o requerimento tem o apoio de 191 deputados e 35 senadores.
Dos representantes de Sorocaba e região, na Câmara dos Deputados, só Jefferson Campos (PL) assinou o requerimento que prevê a abertura da CPMI. O deputado Vitor Lippi (PSDB), disse que não pretende assinar. A deputada Simone Marchetto (MDB), até o momento, optou por não se pronunciar sobre o tema.
A fatura dessa operação abafa está ficando cada vez mais cara para o bolso dos contribuintes. Vários deputados já denunciaram ter ouvido ofertas que chegam a R$ 60 milhões em verbas públicas em troca de uma única assinatura retirada. O deputado Ubiratan Sanderson (PL-RS) disse ter ouvido uma tentativa de suborno do governo para enterrar a CPMI. Mesmo sem apresentar provas, publicou a denúncia nas redes sociais. “Eu ouvi, da boca de um deputado federal que recebeu a mensagem de um emissário de Lula, que quem retirar a assinatura terá R$ 60 milhões de emendas RP-2”, afirmou Sanderson. O ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, negou que qualquer oferta tenha sido feita.
Enquanto o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, procrastina, sem motivos, a instalação da CPMI, as negociações continuam. O Governo parece esquecer que, quanto mais oferecer, mais deputados vão assinar para depois serem convencidos a desistir. Todo mundo sabe que quando um tubarão sente o cheiro de sangue, mais voraz é seu ataque. Lula, neste momento, mostra estar ferido com a possibilidade de uma CPMI atingir os primeiros meses do seu mandato. Quer evitar, a qualquer custo, que investigações mais profundas sejam feitas. O que há para esconder ainda não se sabe, a única certeza que se pode ter é que, pelo bem do Brasil, as invasões de 8 de janeiro tem que ser devidamente apuradas.