Editorial
O desafio do século
A descapitalização do setor agrícola pode causar problemas econômicos principalmente nos Estados das regiões Sul e Centro-Oeste
O Brasil deve colher, em 2024, uma safra de grãos menor que a dos últimos anos. São muitos os relatos de perda de produtividade em vários estados.
O clima não colaborou com os agricultores, houve atraso no plantio e o desenvolvimento das lavouras acabou sendo prejudicado. A safra de soja, nosso carro-chefe nas exportações do agronegócio, deve sofrer o maior impacto.
A redução pode chegar a 20% na comparação com o ciclo passado. Para piorar a situação, a cotação do grão no mercado internacional também recuou.
Isso vai prejudicar bastante os produtores brasileiros que vão colher menos e receber menos.
A descapitalização do setor agrícola pode causar problemas econômicos principalmente nos estados das regiões Sul e Centro-Oeste.
Com uma quantidade menor de dinheiro circulando, o comércio e os serviços das cidades também sofrem. Isso impacta na venda de veículos, de máquinas agrícolas, no turismo e até na construção civil.
A colheita da safra brasileira de soja chegou, esta semana, a 20,9% da área plantada de acordo com os dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).
Entre os estados que iniciaram o trabalho de colheita no campo, Mato Grosso é o que está mais avançado, com 45,4% da área. Já Rio Grande do Sul e Piauí ainda nem começaram a colher.
A primeira safra de milho, chamada de Safra de Verão, entrou também na fase de colheita. Este ano há um certo atraso nos trabalhos, o que pode prejudicar, em algumas regiões, o plantio da Safrinha, hoje bastante importante para a economia nacional.
O cultivo de milho verão do ciclo 2023/24 alcançava no sábado passado 97,3% da área estimada para o Brasil, 1,5 ponto porcentual atrás do reportado no período equivalente da temporada anterior.
A colheita alcançou, até agora, 18,6% da área plantada. Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e São Paulo são os Estados mais avançados.
Enquanto o Brasil patina na produção agrícola, o Conselho Internacional de Grãos (IGC) prevê um aumento na safra global de grãos.
Na safra atual, 2023/24, cerca de 3 milhões de toneladas a mais devem ser produzidas. Isso eleva para 2,3 bilhões de toneladas a produção de grãos no planeta.
Segundo o levantamento do IGC, divulgado na quinta-feira, 15, essa revisão para cima foi possível graças ao desempenho das lavouras de milho.
Só que a boa notícia vem acompanhada de uma preocupação. De acordo com a entidade, o consumo também deve aumentar em 3 milhões de toneladas.
A população mundial deve consumir, neste ano, 2,317 bilhões de toneladas, uma quantidade maior que a que será produzida. Isso vai fazer com que os estoques globais sejam reduzidos.
A estimativa é de que eles terminem o ciclo em 589 milhões de toneladas.
A redução estoques vem num momento de impasse na Europa. Os agricultores de lá, cansados das críticas e dos aumentos de taxas e tarifas, têm tomado as ruas e as estradas para protestar.
Foram diversas manifestações em países-chave como Alemanha, França, Espanha e Itália.
Os agricultores de todo o bloco reclamam que os custos da energia, dos fertilizantes e dos transportes aumentaram, especialmente após a eclosão da invasão da Rússia na Ucrânia.
Além disso, eles se queixam que os governos têm tentado reduzir o aumento dos preços dos alimentos numa tentativa frenética de conter a inflação.
Dados do Eurostat mostram que os preços que os agricultores recebem pelos seus produtos atingiram o pico em 2022, mas têm diminuído desde então.
A queda de lá para cá teria sido de cerca de 9%, em média, um prejuízo que está sendo pago totalmente pela parte mais fraca da cadeia econômica.
As manifestações buscam a retomada do equilíbrio nas contas e nas obrigações, o que pode atrasar a implementação de uma série de medidas de combate ao aquecimento global.
O impasse está posto. A agricultura precisa do clima para produzir bem. O homem precisa da agricultura para sobreviver.
Como equacionar esses fatores e agradar todos os setores envolvidos é o principal desafio deste século.
Até que se chegue a uma conclusão, muita água vai passar por baixo dessa ponte. O Brasil tem de estar atento a essas mudanças para não ficar para trás nessa futura revolução.