Editorial
O começo do fim da saidinha
Ao permitir que presos ainda não reintegrados ao convívio social se beneficiem da saída temporária, o poder público coloca toda a população em risco
Nesta terça-feira (6), a Comissão de Segurança Pública do Senado Federal aprovou o projeto de lei 2.253/2022, que restringe o benefício da saída temporária para presos condenados. Essa decisão poderia ter saído bem antes. Em 3 de agosto de 2022, a Câmara dos Deputados aprovou a proposta que extingue saídas temporárias de presos dos estabelecimentos prisionais.
O texto aprovado foi o substitutivo do relator, o deputado federal licenciado Capitão Derrite (PL-SP), atual secretário de Segurança Pública do Estado de São Paulo, ao projeto de lei 6579/13, de autoria da ex-senadora Ana Amélia (PSD). Vale destacar que Derrite alterou a proposta inicial, que limitava as saidinhas, para abolir completamente esse benefício.
À época, foram 311 votos favoráveis e 98 contrários. Daí, o projeto seguiu para o Senado, para analise das alterações propostas por Derrite, e lá ficou por longos 18 meses.
Na terça-feira, o projeto enviado pela Câmara dos Deputados ao Senado, recebeu relatório favorável do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) e seguiu para a Comissão de Constituição e Justiça, com a informação de que os parlamentares aprovaram um requerimento de urgência para a votação da matéria no plenário.
Flávio Bolsonaro acolheu uma emenda proposta pelo senador Sergio Moro (União-PR). Embora favorável à revogação da saidinha, Moro defende a manutenção do benefício para presos inscritos em cursos profissionalizantes ou nos ensinos médio e superior.
Segundo o Conselho Nacional de Justiça (dados de outubro de 2023), com um universo de 650 mil presos o Brasil ocupa o 4º lugar em população carcerária no mundo, sendo que 57% dos presos não completaram o ensino fundamental.
A saída temporária tem trazido problemas na execução da pena. A cada um desses feriados, presos são liberados aos milhares. No último Natal, quase 3 mil não voltaram. O grande problema é que parte desses presos comete crimes.
Portanto, o texto aprovado pela Comissão de Segurança Pública do Senado Federal revoga o artigo 122 da Lei de Execução Penal (Lei 7.210, de 1984). Pela legislação em vigor, o benefício conhecido como saidinha beneficia condenados que cumprem pena em regime semiaberto. Eles podem sair até cinco vezes ao ano, sem vigilância direta.
O debate sobre o fim da saída temporária voltou à pauta após a morte do sargento Roger Dias da Cunha, da Polícia Militar de Minas Gerais, baleado na cabeça no dia 5 de janeiro, após uma abordagem a dois suspeitos pelo furto de um veículo em Belo Horizonte. O autor dos disparos era um beneficiado pela saidinha que deveria ter voltado à penitenciária em 23 de dezembro e era considerado foragido da Justiça.
Em 4 de janeiro de 2024, reportagem do Cruzeiro do Sul informava que mais de 700 detentos haviam sido recapturados pela Polícia Militar, em todo o Estado de São Paulo, entre 23 de dezembro e 3 de janeiro. Segundo a Secretaria de Segurança Pública (SSP), 631 pessoas que tiveram o benefício da saidinha foram presas por descumprir as regras previstas em lei para permanecer nas ruas no período. Outros 81 detentos foram presos após serem flagrados cometendo algum tipo de crime. Em Sorocaba, no mesmo período, um balanço parcial apontava que seis detentos “beneficiados” foram presos novamente pela Polícia Militar.
Flávio Bolsonaro disse que a aprovação do PL 2.253/2022 é uma resposta à sociedade. “O nosso sistema carcerário infelizmente encontra-se superlotado e, em muitos Estados, com instalações precárias, o que impede a devida ressocialização dos presos. Ao permitir que presos ainda não reintegrados ao convívio social se beneficiem da saída temporária, o poder público coloca toda a população em risco”, enfatizou o senador relator.
O projeto de lei 2.253/2022 trata de outros temas, além da revogação da saída temporária. Um dos deles é a realização de exame criminológico para a progressão de regime de condenados. De acordo com o texto, um apenado só terá direito ao benefício se “ostentar boa conduta carcerária, comprovada pelo diretor do estabelecimento, e pelos resultados do exame criminológico”. O teste deve avaliar, por exemplo, se o preso é capaz se ajustar ao novo regime “com autodisciplina, baixa periculosidade e senso de responsabilidade”. O projeto também estabelece regras para o monitoramento de presos.
Conhecedor do problema, Guilherme Derrite sempre defendeu a extinção da saída temporária. Ele considera a medida necessária, “já que grande parte dos condenados comete novos crimes enquanto desfruta do benefício”. Para o deputado federal licenciado e atual secretário de Segurança Pública paulista, “saída temporária não traz qualquer ganho efetivo à sociedade, além prejudicar o combate ao crime”.