Editorial
O avanço dos golpes de estelionato digital
A mais nova modalidade de golpe é o do 0800 ou da falsa central de atendimento
Os golpes de estelionato vêm alcançando patamares nunca antes vistos devido à digitalização.
As histórias dos sujeitos que venderam terreno na Lua ou a torre Eifel fazem parte do folclore popular.
O tipo de crime (artigo 171 do Código Penal) precisa de alguma participação da vítima.
Em sua descrição é “obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício ardil ou qualquer outro meio fraudulento”.
Muitos foram os vigaristas profissionais que se deram bem num primeiro momento, até serem descobertos.
Bernard Madoff fundou uma sociedade de investimento das mais importantes de Wall Street. Foi preso pelo FBI em 2008.
Um esquema de pirâmide financeira causou prejuízo às vítimas estimado em US$ 65 bilhões, um dos maiores em fraudes desse tipo. O estelionatário morreu na prisão em 2021.
Outro vigarista com bastante criatividade foi o escocês Gregor MacGregor, que viveu no século 18.
Ele simplesmente inventou um país na América para, na Europa, conseguir recursos de investidores e vender títulos de terras a colonos.
Declarava-se o “Príncipe de Poyas”, seu país fictício. MacGregor é considerado um dos maiores enganadores da história, por ludibriar centenas de pessoas, fazendo-as acreditar no que só existia em sua imaginação.
Há golpes que podem ser considerados, não com exagero, pura representação teatral. Um deles é o do conhecido “conto do bilhete da loteria”, em que duas ou três pessoas combinam enganar um incauto nas ruas. O modelo é clássico.
Um dos estelionatários, que se passa por um ingênuo e que não sabe ler, mostra um bilhete que seria premiado.
Aparece outro, aparentemente mais esperto, que percebe e busca convencer a vítima na compra do bilhete a fim de dividirem o prêmio.
É como se a vítima passasse a ser o malandro, enganando o “caipira” para conseguir obter vantagem.
Mas se dá mal, porque perde o dinheiro que entregou, pensando que iria ficar com metade da “bolada”.
Enfim, o crime de estelionato vem há tempos e evolui, adapta-se, conforme as mudanças na sociedade, que inclui a tecnologia.
O telefone foi e ainda é um meio muito usado.
Assim, como facilita a comunicação no dia a dia das pessoas, também serve ao malandro para relatar falsas histórias e atingir seus objetivos de dinheiro fácil.
A acelerada digitalização decorrente dos avanços tecnológicos e a inclusão bancária com certeza melhoraram a vida de muita gente.
É possível fazer pagamentos e movimentações bancárias no computador ou no celular.
A comunicação também é imediata por meio dos aplicativos de mensagens instantâneas, principalmente o WhatsApp, que ganhou a confiança dos brasileiros.
Mas esses meios, apesar dos cuidados eletrônicos de segurança, como senhas, biometria e dupla verificação, abrem possibilidades de novos tipos de golpe, a partir da chamada engenharia social.
Os bancos investem maciçamente em segurança digital, para não ter de arcar com prejuízos de clientes que usam seus sistemas.
No entanto, o estelionatário busca sempre alternativas. E a criatividade humana não tem limites. A mais nova modalidade de golpe é o do 0800 ou da falsa central de atendimento, e vem dando dor de cabeça para muita gente.
Os golpistas enviam milhares de mensagens via SMS ou por aplicativo avisando sobre suposta compra suspeita feita no cartão ou Pix e daí pedem para que a vítima entre em contato por meio de um número de telefone.
Ligando, ela é atendida em uma falsa central de segurança bancária. Simulando ser do banco, a pessoa do outro lado da linha induz a vítima a informar seus dados bancários confidenciais ou a realizar operações a fim de supostamente cancelar a compra.
Esse tipo de golpe utiliza o próprio medo de ser vítima de um golpe e faz muitas vítimas idosas, que, pela idade, são geralmente menos ativas nos meios digitais.
Ansiosas por resolver logo o problema e evitar prejuízo financeiro, muitas pessoas não se dão conta de que estão sendo enganadas.
É claro que a polícia deve ser avisada quando se cai em um golpe como esse, fazendo o boletim de ocorrência, que no Estado de São Paulo também pode ser registrado de maneira on-line.
Contudo, é tanto o volume de golpes que o trabalho preventivo dos bancos e as investigações policiais parecem insuficientes.
Uma das propostas que, talvez seja viável, é que a própria operadora de telefonia ou os aplicativos de mensagens identifiquem que os números utilizados pelos estelionatários não correspondem aos registrados pelos bancos ou operadoras de cartão e os bloqueiem, utilizando sistemas automáticos.
Também valeria uma comunicação direta e efetiva entre as empresas e os órgãos de segurança a partir de cada detecção de tentativa de golpe, utilizando de maneira semelhante os recursos que já são oferecidos nos aplicativos.