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A verdade das redes sociais

23 de Outubro de 2020 às 00:01

Nelson Fonseca Neto - [email protected]

Peço desculpas aos que não são familiarizados com as redes sociais. Hoje vou falar um pouco a respeito delas. Não esperem um texto denso, repleto de palavras graves e apocalípticas. Tratarei de miudezas.

O Facebook é uma rede social. É a que eu uso. Ignoro as demais. Tem a ver com preguiça mesmo. Faz tempo que tenho perfil no Facebook, sou apegado a hábitos, em time que ganha não se mexe, essas coisas.

Já fui mais ativo no Facebook. Faz tempo que entro só para olhar. Tenho muitos amigos que levam a sério o que postam nas redes sociais. Encaram essa postura como uma forma contemporânea de engajamento político. Não acho que estão errados. Muito da configuração política atual resulta do impacto das redes sociais na vida das pessoas. Seria burrice ignorar uma coisa dessas.

Infelizmente eu nunca levei muito a sério o meu perfil no Facebook. Houve uma época na qual eu escrevia uns textos metidos a engraçados. Às vezes soltava uma foto em que eu aparecia vestindo alguma roupa bizarra. Às vezes surgia um vídeo em que eu aparecia dançando alguma música bem brega. Bons tempos. Mas acabaram.

Não sei explicar o porquê. Acho que virou, recorrendo a uma ótima expressão, “carne de vaca”. Tudo muito previsível. A roda não pode parar.

Fiquei na moita desde então. Seria tentador bancar o homem sério aqui e dizer que não relo a mão no Facebook há um tempão. Mentira. Acesso meu perfil todos os dias. Não pretendo mudar minha rotina. O que meus olhos acompanham diariamente revelam coisinhas interessantes.

É que a base de uma rede social é um treco chamado algoritmo. Trata-se, falando bem grosseiramente, de um recurso que vai constituindo o perfil de quem usa a internet. Por exemplo, se entro bastante em páginas de livrarias, meu Facebook mostrará vários anúncios e páginas de livros. É por isso que o que vai aparecendo no seu perfil diz muito a respeito de quem você é.

E quem sou eu? Hoje os anúncios que aparecem no meu perfil do Facebook revelam que estou no caminho de me tornar vegetariano. Tem a ver com o regimão que se iniciou em setembro. A gente vai se empolgando com os resultados. Aí, em poucas semanas, o desregrado com a alimentação vira um devoto do equilíbrio. Importante a gente se policiar nesta fase. Nada mais chato que o recém-convertido.

Bom, mas não posso ignorar o contexto do meu regime. Os vegetais voltaram a ser considerados com carinho. Antes eles eram coadjuvantes bem mixurucas. Eu passei anos comendo salada para não fazer desfeita. Hoje ela é soberana. É muito estranho reconhecer os encantos da cenoura, da rúcula, da abóbora. É muito estranho, mas é o que vem acontecendo.

Claro que a diabólica internet notou esta nova fase da minha vida. Sou bombardeado por anúncios de comida saudável. É a marmita light. É o prato vegano que aparece todo pimpão na foto. Pouco tempo atrás, esses anúncios passariam a uns quinhentos quilômetros longe de mim. E não é que agora eu vou fuçar as ofertas? Quando me deparo com algo interessante, chamo a Patrícia. Estamos descobrindo pratos fantásticos. Semana passada, por exemplo, nos esbaldamos no hambúrguer de lentilha.

Acho que não vai demorar muito até chegarmos aos doces cheios de fricotes. Aparecem na tela do meu celular umas fotos bem apetitosas de brigadeiros e bolos. Antes eu riria da possiblidade de relar num doce desses. Agora, depois do hambúrguer de lentilha, o horizonte é bem mais receptivo.

Assim, do nada, tornei-me um sujeito criterioso com a alimentação. Por afinidade temática, aumentou o fluxo de anúncios de tênis de corrida e de marcadores de frequência cardíaca. E que chorem as lanchonetes e seus lanches de três andares.

Cada coisa, não?